O mercado, contentinho, está esperando a remessa ao Congresso do saco de maldades. Nossas atenções e expectativas estão orientados para o saco que não vem porque as maldades podem ser urdidas e concretizadas, muitas delas, sem passar pelo Congresso. Passar pela discussão como a sociedade, nem pensar… Afinal as bancadas da bala, da bíblia e do boi existem para aprovar como vacas de presépio o que de urdido for nos palácios.
E as maldades aparecem como se não fossem. Revestem-se de decisões “administrativas” a serem tomadas depois de acertadas as arestas do jogo de interesses vorazes dos financiadores e apoiadores do golpe de estado. Assim, costuram os bancos retirar da Caixa Econômica Federal o monopólio da arrrecadação e gestão do Fundo de Garantia de Serviço, um fundo que pertence aos trabalhadores e por isso mesmo os lucros que possam gerar deveriam ocorrer num banco estatal, como até agora. Mas o olhar de rapina dos banqueiros avança com fome e vontade de comer. Isso nem passará pelo Congresso e será dado como uma medida administrativa. Estou falando em “ser dado”, porque será um presente para os bancos.
Outra maldade: elevação para financiamentos de casa própria pelo Caixa Econômica para residências “populares” até o valor de R$ 3 milhões!!! Ora, como não fabrica a Caixa Econômica o dinheiro que empresta (aliás muito dele vem precisamente do FGTS), então um financiamento de 3 milhões retirará o dinheiro do mesmo bolo de limite de recursos disponíveis. Quais financimanentos serão prejudicados? Os grandes contratos ou os pequenos contratos populares? Esta maldade passa como uma bondade. Bondade para quem já tem (porque só constroi ou compra casa de 3 milhões quem tem “pé de meia” como se dizia antigamente).
Maldade maior: em nome da qualidade de gestão das escolas públicas, entrega-se a gestão a organizações sociais. Atualmente a gestão não custa aos cofres públicos nada mais do que os salários que já pagam aos professores que assumem esta tarefa nem sempre fácil de liderança que exige transitar tanto pelo aspecto pedagógico quanto pelo aspecto adminsitrativo, que neste caso, é extremamente burocratizado. Pois não estão satisfeitos os índices desejados. De quem é a culpa? Da gestão da escola. Neste raciocínio absolutamente tortuoso, troque-se a gestão. Gratuitamente? Conversa para boi dormir esta gratuidade das organizações sociais e das ONGs que de não governamentar tem muito pouco porque vivem das verbas públicas. Ora, há jeitos de pagar pelos serviços de gestão escolar que exercerão, fazendo parecer que isto tudo é gratuito de uma legião da boa vontade social… Maldade que vem sendo praticada pelos estados sem que o MEC, responsável pelo cumprimento da lei que obriga o Estado a manter e garantir o direito educação. Aqui, a maldade vem pela omissão no nível federal e pela ação no nível estadual.
Se o modelo pegar, teremos a seguir outra maldade: em lugar de o Estado contratar professores, contratará uma Fundação para que providencie que sejam ministradas tantas milhões de aulas. A Fundação prestará o serviço. Terceirização e precarização estão no horizonte das possibilidades… Ninguém quer comprar as escolas: não haverá privatização, porque o “mercado” só quer o lucro, não os custos sociais da escolarização do povo que prefere fique na ignorância mesmo… ops! não pode ser uma ignorância total porque há organismos internacionais atentos à escolaridade e sua suposta qualidade. Então, ensine-se alguma coisa porque a televisão fará com que qualquer espírito crítico desapareça. Isto quando sobre tempo ao povo para ver TV, porque nas condições de trabalho e moradia, gastam 3 a 5 horas indo e vindo para o trabalho, e trabalham 8h45m (estes minutos são para compensar o sábado à tarde, no comércio; na indústria não conheço a compensação do sábado!). De modo que as próprias condições de vida embrutecem e fazem esquecer o que aprenderam nos bancos escolares.
Maldade milionária: já avisou o ministro dos bancos que ocupa a cadeira na Fazenda que o rombo das contas será muito maior do que previam… A equipe de Dilma previa menos de 100 bi; a equipe do perdulário Michel Temerbroso prevê 170 bi e agora diz que vai gastar mais ainda. A desculpa sempre será a queda na expectativa de arrecadação. Mas as necessidades são outras: há que pagar o golpe, há que pagar apoios, há que “conquistar” apoios. E não é de parlamentares e governadores que se fala. Aqui se trata de outro setor da rapinagem: os veículos massivos de comunicação. Ou pensam que a Globo não está apresentando sua conta? Vejam, uma maldade que nem aparece como tal – não estaria no saco de maldades! É “decisão” administrativa.
E assim vamos indo: grandes maldades praticas à luz do dia, enquanto estamos focados na maldade da retirada do Estado de sua função primeira: um tertius necessário às relações sociais. Quem sabe, de futuro, privatizam também a prestação da justiça! Já foi um pouco assim no Império Romando. Mas essa maldade ficará para o próximo golpe, porque a magistratura garantiu sua existência e permanece muito operante para que as coisas sigam no trilho que traçaram os golpistas.
Para finalizar, vou fazer uma sugestão ao Ministro da Chevron, o vendilhão do patrimônio público (sempre sobra alguma coisa…): venda os Lençois Maranhenses à exploração turística de conglomerados norte-americanos. Eles farão do lugar uma nova Cancun… E ainda darão empregos de faxineiras, serventes, garçons, camareiras e tudo o mais para o que vocês devem chamar de povinho brasileiro, este de que vocês não conseguem se ver definitivamente livres!
E que não se diga que não tenho colaborado com ideias para o futuro do golpe! Depois vou cobrar também o meu quinhão, mas por favor, antes de ficarmos nus e recorrermos ao FMI como já recorreram no final das privatarias feitas à la FHC e José Serra, que, como disse o próprio “príncipe dos sociólogos”, era o mais afoito privatizador de seu governo! Por isso se tornou ministro da Chevron. Um prêmio merecido!
João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.
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