Universidades brasileiras, onde estais que não as vemos? O que falais e dizeis que não as escutamos? Qual o mundo que dizeis e qual o mundo que escreveis que não lemos? Porque escreveis o mundo escrito que escreveis? E porque não escreveis o mundo não-escrito? Porque não fazeis a autocrítica do papel e da missão pública, hoje em decadência vertiginosa de que padeceis? E porque não fazeis a autocrítica (mea culpa) da vossa omissão coletiva? E porque não fazeis a crítica do momento histórico da conjuntura atual da política brasileira – atores, protagonistas, personagens, circunstâncias dos fatos e acontecimentos, luta de classes pela hegemonia no poder? Enfim, porque não teorizais o real dado na perspectiva materialista histórica em processo de uma nova cultura da civilização da imagem telenovelizada?
A sensação clara e clamorosa que temos, hoje, é que as nossas universidades estão se sentindo frágeis – talvez omissas por acomodação e conforto corporal e mental – nos campos minados de disputas e lutas políticas do Brasil atual. As manifestações históricas de crítica consistente, de cientificidade dialética, da socialização pública dos conhecimentos, particularmente nos campos de história, ciência política, sociologia, literatura, artes visuais e musicais, presentes e vigorosas em noutros momentos da história do Brasil, hoje, tristemente, estão ausentes nos espaços de nossas universidades. As raras manifestações de críticas são individuais, que expressam a consciência singular de cada um nas redes fascinantes do mundo virtual. São tempos do encantado, admirável e fascinante mundo eletrônico – mundo da linguagem e imagem virtuais. A arte de narrar dos intelectuais de outrora foi extinta. No lugar da narrativa foi implantada imperiosamente a informação. Morreram os narradores intelectuais e nasceram os gloriosos comunicadores e apresentadores, mercantilizando a sensação sem eiras, nem beiras. Esta, sim, a sensação acabou de vez com a informação e a narrativa genealógica – oral e escrita – da história humana.
Diante desta nova civilização da imagem, onde estão, e tomados por qual postura teórica e metodológica, os nossos intelectuais – professores, pesquisadores, ensaístas, escritores, literatos, artistas…? No palco de acirramentos das lutas políticas, as nossas universidades públicas estão ausentes. Por acaso estão nos bastidores? No subsolo do palco? A sensação clamorosa é de que estão se sentindo frágeis no campo minado da luta de classes. Talvez, em nome da bendita, eterna e poderosa neutralidade ideológica-científica.
Magníficos reitores, prezados diretores, coordenadores, professores, pesquisadores, estudantes e servidores técnico administrativos, creiam-me, escrevi o que escrevi com profundo e elevado sentimento de sinceridade e desalento. Durante 40 anos lutei e continuo lutando por uma universidade mais engajada com os problemas reais e vivos, com potencial de transformações da nossa sociedade.
Professor, pesquisador, escritor
José Kuiava é Doutor em Educação pela Faculdade de Educação da Unicamp (2012). Atualmente é professor efetivo- professor sênior da Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Planejamento e Avaliação Educacional, atuando principalmente nos seguintes temas: autobiografias.inventário da produção acadêmica., corporeidade. ética e estética, seriedade, linguagem, literatura e ciências e riso.
Que beleza de texto Kuiava! Que silêncio ensurdecedor é esse que sai das universidades, e alcança o passado de abandono e sucateamento das instituições públicas…um ultimo grito fora ouvido ainda por ocasião dos cursos de denúncia do golpe, mais nada…e confesso que foi muito tímido, quase tentando salvar os afogados em tristeza nesse atoleiro de comportamentos comedidos e tanto bom-mocismos…
Compartir com Mara Emília. Assim, é lindo e alentador escutar sua voz. Precisamos compartir nossos escritos e nossas vozes nesta situação calamitosa das nossas universidades públicas. Vivemos no mundo do WhatsApp – uma tecnologia fascinante, aproxima os distantes e distancia os próximos – onde a arte e a estética da narrativa estão em plena extinção, porque não há mais leitores e não havendo leitores, não há intelectuais narradores. Precisamos continuar de cabeças erguidas sempre.
Kuiava, quando se encerrou a ditadura militar, foram em busca de projetos e propostas nas universidades, elaboradas no silêncio imposto. Abriram as gavetas e não encontrarem nada além de alguma que outra proposta específica. Pensar o Brasil deixou de ser preocupação da universidade brasileira. Naqueles tempos os “pesquisadores” estavam nos aeroportos esperando o último paper de algum pesquisador do exterior, porque só dialogavam e dialogam com o exterior. O sonho é ser uma universidade universal, isto é, norte-americana! Não creio que o silêncio de hoje seja consequência de uma produtividade exacerbada de reflexão… o que importa é uma linha a mais no Lattes, e elevar a nota das pós-graduações, aliás os cursos menos enraizados na cultura brasileira: cada curso parece uma árvore de Natal: cada doutor pendura nela sua “doutrina”, isto é, a corrente de pensamento em que fez seu doutorado… Próprio? Que próprio?