UM FILHO LÁ, MAS NÃO HAVERÁ UM FILHO CÁ

Embora junho já se tenha ido, com o seu dia dos namorados, com as festas de Santo Antônio casamenteiro, com os bailes de São João, Jair Bolsonaro continua a trocar afagos com Donald Trump e imagina que indicar seu filho embaixador nos EEUU é encaminhar para seu Presidente e chefe um reforço na sua campanha de reeleição.

Trata-se de um presente de aniversário: o 01 fez 35 anos, idade mínima para ser embaixador. Aí o presidente de cá disse que cogitava nomear Eduardo Bolsonaro, como embaixador para lá. Para ‘naturalizar’ o nepotismo e insanidade daquele que elegeu, as Organizações Globo informam como verdade o que era ironia nos EEUU: Trump teria respondido que cogitava mandar para cá o seu próprio filho Eric, neste jogo de deferências de aparente igualdade de relações que as organizações Globo tentam fazer crer que existem. Não é verdade! Trump não é bobo e não mandará filho para cá coisa nenhuma.

Todos sabemos que as relações com os EEUU, desde que começou a monarquia Bolsonaro, não são de igualdade e equivalência: o de cá já bateu continência para a bandeira do outro; já declarou inúmeras vezes amores pelo país do outro, e tudo faz para que seu país perca grandes parceiros comerciais para abrir negócios para o outro. Que valha o exemplo da soja para a China: a imbecilidade local esbravejou, deu a entender que não queria mais saber de ‘comunistas  ‘ chineses… e o de lá aproveitou o ensejo, e passou a exportar mais soja para a China, enquanto que o país de cá sofreu uma queda.

Outro exemplo? Que a Perdigão e a Sadia lhes apresentem: graças aos flertes com Israel a gosto dos neopentecostais (e a mando do presidente de lá): uma redução de 20% na exportação para os países árabes. Os paranaenses, tão solícitos para com a República de Curitiba e para com o pensamento (há pensamento?) de Bolsonaro, perderam nada menos do que 1.400 empregos quando a Perdigão e Sadia fecharam uma de suas unidades de produção no Estado.

É assim que vamos virando piada internacional: Eduardo Bolsonaro se vangloria que fez intercâmbio nos EEUU e lá fritou hambúrguer! Uma credencial e tanto para ser embaixador. E mais, quando por lá esteve, pôs o boné de campanha de reeleição de Trump. Como agirá durante a campanha?  Tomará partido novamente? E se os democratas ganharem no voto, que fará nosso ‘abaixado’ embaixador? Fará conspiração, como se a robusta democracia de lá fosse o arremedo de cá, onde a cada período da república, sempre que alguma conquista popular acontece, existe um golpe?

Aqui, a cada 30 anos, um golpe (notem: Floriano agiu como ditador já nos inícios da república; houve o Estado Novo depois de três dezenas de anos; mais três dezenas, o golpe de 1964; mais três dezenas, o golpe de 2016). Será que ele imagina a embaixada brasileira como um bunker de conspiradores republicanos caso Trump perca as eleições?

Mas tudo são especulações. Afinal, a indicação deve passar pelo Senado. Teria o Senado coragem de se contrapor à vontade do clã? Alguns senadores dizem que não aceitam; mas não faltarão os senadores do PSDB para ficarem no muro e votarem a favor daquele que pretende se consolidar como a liderança jovem da extrema direita nas Américas (quiçá no mundo).

Uma liderança cuja cabeça serve apenas para portar um boné… e uma capacidade inata de repetir Olavo de Carvalho, um guru que sabe das incapacidades do seguidor e por isso já se manifestou contra sua indicação à embaixada, passando-lhe outra tarefa: conseguir uma CPI para investigar o Forum de São Paulo, nesta perseguição persistente contra a esquerda.

Na maluquice em que se tornou este país, tudo é possível: até Eduardo Bolsonaro se tornar embaixador, mesmo contra a vontade do guru, porque afinal às vezes o Jair ergue a cabeça e quer mandar também… e o Carluxo ocupar a cadeira presidencial dando ordens a ministros quando não acompanha o pai em viagens para o exterior: fica no Planalto, guardando o lugar, a cadeira, a caneta.

João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.