Na manhã do dia 21 de abril último, um habitante mineiro de Vila Rica – atual Ouro Preto – ficou tomado pelo pensamento sôfrego e possuído impulsivamente pelo desejo de caminhar pelos lugares onde foi morto e esquartejado Joaquim José da Silva Xavier – o bravo herói Tiradentes. O roteiro da caminhada seria: primeiro, passar pela praça pública de Vila Rica, lá onde Tiradentes foi enforcado, o corpo esquartejado e a cabeça foi encravada numa estaca e exposta ao povo horrorizado, no dia 21 de abril de 1792. Tiradentes foi condenado pela justiça do Rio de Janeiro a mando do governador da Capitania de Minas Gerais, Visconde de Barbacena, nomeado pela Coroa Portuguesa. Na praça, muito acabrunhado e nostálgico, o professor emérito de história sentou-se num banco e passou a meditar e rememorar a história de vida e morte de Tiradentes. Passou sentir as dores físicas e mentais que Tiradentes sentiu nos instantes trágicos do seu enforcamento.
Depois, já comovido e revoltado com a barbárie cometida naquela praça, agora rememorada, cada vez mais abalado, o professor de história seguiu caminho pela estrada que leva para o Rio de Janeiro. Lá, o local onde foram jogadas as partes esquartejadas do corpo de Tiradentes, espalhadas pelos barrancos, expostas nas pedras e nas árvores, à vista de todos os que por lá passavam. Tudo para botar medo nos trabalhadores, escravos e todos que lutavam pela liberdade e pela independência. A passos lentos, o professor foi chegando. Olhando aquela paisagem triste, respirava silenciosamente. Um silêncio sepulcral. De repente começou escutar coisas. Vozes de homens. Muito assustado, pois não havia ninguém no lugar. Foi andando mais perto, com o coração já batendo forte, começou escutar a conversa.
– Temer, ontem você me insultou covardemente! Você se comparou a mim. Você nunca foi, não é e nunca será o Tiradentes! O Tiradentes do dia 21 de abril, homenageado de herói, sou eu, Joaquim José da Silva Xavier!
– Joaquim, eu me comparei ao Tiradentes só para elevar a minha imagem! Que tá uma porcaria, uma vergonha! Ninguém aprova meus programas. Pior, menos de um por cento dos eleitores irá votar em mim para presidente.
– Mas você, Temer, não podia se comparar ao Tiradentes. Você é um presidente golpista! Só está à serviço dos grandes exploradores, do jeito que foi nomeado o Visconde de Barbacena pela Coroa Portuguesa. Você, Temer, está a serviço das elites brasileiras a mando e serviço dos patrões estrangeiros do jeito que Barbacena estava a serviço da Coroa Portuguesa.
– Eu sei, Tiradentes, eu sei! Mas…
– Mas o que?
– Eu sei que as elites brasileiras sempre entregavam e continuam entregando sem fim as nossas riquezas naturais – patrimônio comum, bem de todos – de mão beijada aos poderosos e proprietários estrangeiros avarentos. Eles são os meus verdadeiros patrões. É claro, escondidinhos e protegidos pela mídia hegemônica.
– Eu, ao contrário, Temer, durante minha vida toda combati a exploração e o roubo das nossas riquezas! Lutei até a morte pela liberdade e independência. Fui condenado à forca pelos poderosos, mas não me entreguei!
– Eu sei. Você, Tiradentes, você é um herói do Brasil. É por isso que eu preciso me comparar a você para esconder o que sou na vida real. O contrário de você.
– Mas isso é mentira, é falsidade, é mais um golpe contra o povo e o Brasil. Você é o corrupto ignóbil, ocupando o cargo mais elevado do Brasil para proteger os políticos e empresários corruptos, ladrões…
– Tiradentes! Por misericórdia! Quero que você entenda, eu preciso, eu devo continuar no poder senão o PT do Lula voltará ao Planalto.
– É exatamente isso que o Brasil precisa! Lula no Planalto. Hoje ele está no cárcere a seu mando e por determinação do poder supremo do Brasil.
– Por Deus do céu, Tiradentes!
– Por Deus, não! Você é do Satanás e dos diabos do inferno! Você continua desrespeitando e profanando o nome sagrado e o nome de quem lutou honestamente para o bem dos brasileiros.
– Por gentileza, Tiradentes, você está morto e não perde nada com isso!
– O que? E o povo brasileiro, que você explora para enriquecer ainda mais as elites brasileiras e estrangeiras – doando a Petrobras, a Eletrobras e tantas outras riquezas, patrimônios e bens comuns de todos nós – até quando vai aguentar as suas maldades e mentiras?
– Mas!…
– Chega! E nunca mais se compare ao Tiradentes!
Professor, pesquisador, escritor
José Kuiava é Doutor em Educação pela Faculdade de Educação da Unicamp (2012). Atualmente é professor efetivo- professor sênior da Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Planejamento e Avaliação Educacional, atuando principalmente nos seguintes temas: autobiografias.inventário da produção acadêmica., corporeidade. ética e estética, seriedade, linguagem, literatura e ciências e riso.
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