Outro dia que não hoje uma amiga pediu-me que escrevesse sobre mulheres, sobretudo mulheres negras, eu penso que é preciso escrever muito sobre esse assunto, mas de pequena me ensinaram a não “futucar” as feridas, de modo que a escrita sobre mulheres negras está em todos os meus textos, e se não se declaram, posso afirmar que estão nos silêncios deles também.
Na verdade, ou melhor, na minha verdade é preciso confessar que sempre que ouço isso, ou suas variações (supostamente elogiosas???) que são:- você escreve como mulheres brancas! Dou conta de quão longe estou do meu compromisso com o a minha voz literária.
E tudo é marca discursiva, segundo o Bakhtin, mas na verdade eu descobri isso em conversa com o amigo Wanderley Geraldi, com quem aprendo sempre.
Escuro que meu texto é cheio de silêncios, porque é com essa prática que fui violentamente educada na sociedade (nunca pela minha família), e suas principais instituições, sem nenhuma dúvida, foram responsável por o malfeito e bem aprendido: Escola, mídia, igreja, universidade e ainda partido político. Todos têm seu quinhão de racismo e miséria para dar, e deram e darão sempre até que algo aconteça.
Aprendi a estar invisivelmente em muitos lugares, percebam que estar é diferente de ocupar. Estar exige permissão, ocupar é outra paradinha.
Acreditem, ou não, ainda parece que quando escrevo sobre invisibilidade negra as pessoas pensam apenas nos muito pobres, ou miseráveis, ou seja, eles são mesmo invisíveis (e daí, não é?), o que não é verdade, nem parcialmente.
As mulheres, sobretudo as negras, são preteridas sim em empregos, relacionamentos, lideranças, processos seletivos, mestrados, …. E a lista infindável continua, é só olhar para o lado, e em muitos casos os homens negros estão juntos de nós na invisibilidade até que eles ascendam e possam eles mesmos nos invisibilizar.
Assim como as mulheres brancas, e as afro convenientes, elas amam sororidade, mas amam ainda mais nos pagar para cuidar dos filhos delas ou mesmo limpar suas casas, enquanto elas vão pros roles, ou precisam estudar, ou se qualificar, ou escrever, ou tantas coisas… Adoram pautas emancipatórias, mas sequer pensam quão prioritárias são as pautas das mulheres que não tem vaga na creche para deixar seus filhos para trabalhar, quão prioritária é discutir o encarceramento dos filhos e filhas dessas mulheres que foram criados sem a presença das mães trabalhadoras, lutar pelo fim do assassinato dessa juventude negra.
Onde será que essas mães ausentes estavam? Essa pergunta é sempre recortada pelo silêncio, dos que fingem não ver quem lhes serve quase sempre de cabeça baixa.
É verdade não falo da mulher negra, porque nem sou. Quando se é invisível, a gente não existe. Não é uma ameaça, mas quando eu resolver incomodar…
Professora, militante, escritora
Mara Emília Gomes Gonçalves é formada em Letras pela Universidade Federal de Goiás. Gestora escolar, professora, militante, feminista, negra. Excelente leitora, escritora irregular. Acompanhe-a também em seu blog: LEITURAS POSSÍVEIS.
1 Comentário