Quinta-feira nas ruas

Embora alguns comprometidos comentaristas em jornais tenham tentado fazer um humor sem graça, chamando a manifestação de quinta-feira como o “protesto a favor”, creio que o mais justo é chamar de um protesto contra: contra a articulação golpista, pedindo respeito ao voto que elegeu Dilma; contra a política econômica do governo; contra o explosivo presidente da Câmara dos Deputados. Aliás, no domingo anterior, um cartaz me chamou atenção: “O Cunha é corrupto, mas está do nosso lado”!!! Um paradoxo para quem estava na rua em defesa da lisura nos negócios públicos… Nem quero comentar a entrevistada que se diz de direita, e quando lhe perguntam a razão de ser de direita, chama a mãe para “ensinar” a responder!

Mas há que apontar: o número de cidadãos presentes à manifestação de quinta-feira foi bem menor do que aqueles que foram às ruas no domingo. Ou há uma imensa maioria silenciosa, ou há uma multidão que não pode ir às ruas num dia de trabalho, num período em que faltar ao trabalho pode ser bom motivo para entrar na lista das demissões. 

Não sei quando, mas tenho a esperança de que um dia os movimentos sociais, os partidos políticos e os sindicatos percebam que convocar a presença de trabalhadores nas ruas em dia de trabalho é impedir a adesão. As burocracias partidárias, sindicais e dos movimentos sociais talvez tenham perdido a noção do que significa faltar ao trabalho! Na quinta, a gente via até na TV as pessoas chegando quando a manifestação já estava terminando… Isso não ensina nada? Trabalhador não vai para a rua aos domingos? Ou são as lideranças que não querem ir para a rua aos domingos? Mantendo este mau costume, amargaram sempre um público quase decepcionante.

 

 

João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.