Depois do julgamento do TSE impugnando o registro da candidatura de Lula à presidência (e ao gosto barrosiano, do aparecimento de sua imagem na campanha!!!), constatamos o óbvio e ululante.
Não pensem que estou pensando que o golpe abriria as pernas. Não! Nem o judiciário comandado por D. Carmen, da casa da intolerância, haveria de fazer isso. Manteria o combinado, o desejado: afastar de qualquer forma o indesejado do golpe. E indesejado porque ele poderia acender alguma luz de esperança de que este país poderia – como já pôde por breve espaço de tempo – ter alguma independência, ter algum valor no concerto das nações. Não, nada disso pode! É preciso barrar estas possibilidades deste “povinho de merda”, como eles pensam e dizem, se arvore povo de uma nação.
Então tivemos o resultado esperado. Uma “derrota” de Lula que será cantada em prosa e verso pela Rede Globo e outras incenseiras do golpe: agora o país se tornará “confiável” e o “investidores” podem tomar conta. O Judiciário brasileiro garante.
Mas o óbvio e ululante que brilha neste momento, depois da reunião plenária da Casa da D. Carmen Lúcia, é que sendo permitido terceirizar tudo, o governo (do Bolsonaro? Do Picolé de Chuchu – afinal, o judiciário deve decidir de uma vez por todas em quem devemos votar) poderia terceirizar os serviços jurisdicionais. Se todas as atividades-fim podem ser terceirizadas, então uma das atividades-fim do Estado pode ser terceirizada: os serviços jurisdicionais de que precisam ser prestados.
Com a decisão da terceirização de tudo e com a decisão barrosiana do TSE, juntando uma com a outra, está na hora de pensarmos uma campanha pela terceirização dos serviços que prestam a polícia (federal, em particular), as procuradorias (em geral e sem restrições), os juízes, os desembargadores, os ministros.
Note-se: serviços de segurança privados existem aos montões. Assim, terceirizar o que faz a PF estaria dentro do desejado pelo mercado. As procuradorias, tendo se tornado absolutamente contrárias a qualquer direito social, e tendo se especializado em powerpoint das convicções a que chega com base nos indícios sem provas, poderão ser facilmente terceirizadas, com grandes vantagens: haveria uma economia enorme por não ser mais necessário pagar penduricalhos sobre os altos salários. Os juízes, os desembargadores, os ministros: todos seriam contratados através de empresas fornecedoras de serviços. E estas nem precisariam se preocupar na seleção dos seus cooperadores: não precisam ser especialistas em nada. Poderão exercer as funções apenas perguntando à Rede Globo, porta-voz do “mercado”, onde de fato estão os patrões, o que decidido deve ser. Nem precisam criar argumentos nem revestir suas falas de juridismo. Isto de lei, de obediência às leis, isso tudo é coisa do passado, coisa destes retrógrados petistas. A lei é ditada no momento pelo interesse maior da manutenção da livre circulação de capitais. O resto é bobagem destes esquerdistas que acham que ainda é necessário pensar em construir uma sociedade de homens e mulheres.
Também estes são dispensáveis. Tendo cumprido seus papeis de consumidores, podem ser jogados na cesta do lixo. O importante é manter a renda, a renda, senhores. E se para mantê-la e fazê-la crescer é preciso terceirizar, terceirizemos os serviços de prestação jurisdicional… afinal, tudo o que é privado é melhor… Ficarei com pena daquela que é um poço de ódio contra Lula, aquela que diz que o Brasil não tem cidadãos, apenas “jurisdicionados”, a chefe geral da Casa. Vai perder o cargo, mas que fazer? Afinal, ela esteve na linha de frente para que tudo fosse terceirizado!!! Vamos terceirizá-la, minha gente, para atender ao que ela tanto deseja. Afinal, jurisdicionados não devemos nós nos comportar como cordeirinhos de cabeça baixa?
João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.
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