Qual é a pergunta que já se tem a resposta?

Nos dias atuais, (parece modelão de redação de professor preguiçoso) é muito comum que para ganhar espaço e visualizações nas redes sociais e mídia as pessoas falem escrevam sobre assuntos polêmicos.  Se a opinião for polêmica melhor ainda, se for uma imbecilidade, e não vou aqui discutir os critérios para averiguação desta modalidade, muito melhor.

Bem, dito isso, o assunto polêmico tem uma condenação e 35% nas pesquisas de intenção de voto: Lula. Aviso para aqueles, os que não aguentam mais, para que possam parar a leitura por aqui. Sou como Lula, democrática. Juro, sem ressentimentos.

Antes de dormir na noite passada li parte da entrevista do presidente Lula concedida aos jornalistas Juca Kfouri e Maria Inês Nassif, para o professor de relações internacionais Gilberto Maringoni e para a editora Ivana Jinking.

( ver mais em : https://www.diariodocentrodomundo.com.br/essencial/estou-pronto-para-ser-preso-diz-lula-em-novo-livro-de-entrevistas-tudo-isso-faz-parte-da-historia/ )
Ao terminar de ler fico me perguntando porque será que existem pessoas assim:  Dedicadas, crédulas num futuro melhor em que as pessoas vão saber o que aconteceu nos dias atuais  e saberão que foi golpe, que foi mentira, que Lula fora preso sem provas, enquanto pulam provas de tantos outros e nada acontece. E daí?

Que tempo, que dia, que momento a democracia vai se restabelecer ? Nada disso será dado pelo futuro Lula. A pergunta é: que horas ela volta?

Queria estar enganada, mas penso que não. Não há volta. Não tiraram Dilma, aprovaram um lei trabalhista danosa, um entreguismo sem fim para aceitar Lula de novo, ou Boulos, ou Manoela, ou mesmo o bipolar Ciro Gomes.

E nessa mesma entrevista tenho o exemplo clássico, de fora da situação Lula fala sobre o governo Dilma e que este não fora defendido até as últimas consequências por quem mais precisava, ou mesmo por quem estava ali ao seu lado, no caso, seus ministros. Dois anos depois, somos o futuro daquele dia em Dilma foi retirada de um mandato legítimo, e as pessoas de hoje sabem que foi golpe, que contra Dilma não pesa nada, que foi deposta injustamente, mas vivem como se o amanhã não fosse tão distante.

Em um descuido rápido, permito-me acreditar que não prenderão Lula por que assim a vitória de seus oponentes terá um gosto amargo, um recibo rasurado, um olhar sempre cabisbaixo. Tolice.  Nada que uns óculos de sol, um depósito na Suíça prescrito no STF, um champanhe caro não ajudem a esconder. Integridade não faz rima com poder.

Passados dois anos que assisti o filme Que horas ela volta? de Anna Muylaert, ainda fico pensando em muitas cenas do filme.

Um nó na garganta em vários momentos.

Na faculdade aprendi sobre catarse, que é um momento de purificação por meio da experiência profunda que a narrativa provoca. É tipo assim: você lê algo, aquilo mexe profundamente com suas feridas e dores, porque você se reconhece/identifica com a dor do outro e então você consegue por meio do sofrimento do outro, se libertar do seu. (espero que minha professora Goiandira nunca leia esse post)

A cena mais forte é a dona da casa mandando tirar toda água da piscina porque deu rato, numa resposta a filha de sua empregada Val ter entrado lá. Outra construção belíssima do filme é a possibilidade de “ascensão” da jovem por meio da generosa proposta do dono da casa em transformá-la em uma moça bela, recatada e do lar.

Não consegui com certeza me purificar, ser uma pessoa melhor depois desse filme maravilhoso, que causou muito constrangimento (será?), e das relações sociais brasileiras expostas sem mostrar as vísceras.

A linguagem do filme é quase pedagógica. 

Está lá no filme: a mulher que abandona sua família, inclusive afetivamente, por razões econômicas e por isso mesmo pensa constituir com o núcleo dos seus patrões e filho uma nova família; O rapaz, filhote da elite, que fuma seu baseadinho que ele não compra na favela, (onde será que ele compra?) e esconde com a ajuda da mãe-postiça-empregada; A socialite que dá entrevistas inócuas para ninguém ler e ver, e festas para aparecer nas revistas de fotos; O velho rico que precisa uma jovem para transfundir vitalidade. O quartinho de empregada. O fulltime da funcionária. Até o discurso cínico: ela é quase da família.  Está tudo lá, e muito mais.

Uma parte do filme que está lá e que ninguém quer ver é que se as oportunidades chegassem muitos jovens sairiam da pobreza e da miséria, hereditárias, e teriam direito a sonhar.

Esse Lula é um vagabundo mesmo! (frase totalmente fora do contexto, ou não!)

O que muita gente não quer ver é que isso incomoda: ter que competir e perder para um nordestino, pobre, trabalhador é ruim; mexer nas velhas estruturas sociais, em uma sociedade que aprendeu a escravizar e neo-escravizar sem um pingo de pudor, causa muito mal estar e é imperdoável, embora nem sempre os que vivem à margem consigam enxergar que as violências que os cercam, produzem e produzirão em seus filhos cada vez mais frutos, e nunca se sabe quanto esses frutos poderão se tornar mortais.

intervenção já! mas não em mim que sou doce e mansa. Só se for no modelo de intervenção que os pais aplicam ao Fabinho. 

– Eu quero é viajar e esquecer que não passei no vestibular, ano que vem quando voltar essa bagunça já deve estar mais organizada, os pobres voltam a trabalhar três turnos nos empregos intermitentes e sem tempo para estudar, e aí sim vai sobrar vaga pra entrar!

Invenção já! 

*este texto foi publicado em 14/03/2018

Professora, militante, escritora
Mara Emília Gomes Gonçalves é formada em Letras pela Universidade Federal de Goiás. Gestora escolar, professora, militante, feminista, negra. Excelente leitora, escritora irregular. Acompanhe-a também em seu blog: LEITURAS POSSÍVEIS.

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