O acordo firmado entre os dois partidos do campo da esquerda tem sua justificativa no propósito a unidade do campo nas eleições de 2018. Sabidamente, o PT tem hegemonia tanto por sua história quanto pelos índices obtidos nas pesquisas eleitorais, dando vitória certa e no primeiro turno a Lula. O PSB, por seu turno, não apresentou qualquer candidato à presidência e era “objeto de desejo” do candidato Ciro Gomes (PDT).
O acordo firmado isolou Ciro Gomes, que se apresenta também como candidato do campo da esquerda, além das candidaturas do PSOL (Guilherme Boulos) e do PCdoB (Manoela d’Ávila). O campo se apresenta, assim, dividido com quatro candidatos à presidência.
O PSB, ao fechar o acordo com o PT, definiu-se como neutro, nacionalmente, em relação às candidaturas presidenciais da esquerda. No entanto, sabe-se que a sigla, muito antes de fechar este acordo, estava esfacelada em diferentes tendências: parte apoiará Ciro Gomes; em São Paulo o atual governador e o partido apoiarão um candidato do centro-direita (Geraldo Alckmin e sua vice Ana Amélia, cuja presença mostrou que a candidatura está mais para a direita do que para o centro); em Minas Gerais mesmo que a direção nacional do partido consiga excluir seu candidato ao governo do estado, o PSB apoiará também o candidato Geraldo Alckmin. Ou seja, a neutralidade do PSB veio a calhar para que o partido não se esfacelasse nas eleições deste ano. Cada um dos múltiplos setores e ideologias que o compõem – algumas delas a quilômetros de distância do socialismo – está livre para apoiar qualquer dos candidatos, de qualquer espectro no campo ideológico… Provavelmente, ao menos no primeiro turno, não haverá apoio a Bolsonaro, da extrema direita, mas ninguém garante que no segundo turno, sendo entre um candidato do PT e Bolsonaro, se a sigla em algumas regiões não vai apoiar a candidatura da extrema direita. Afinal, o “socialismo” da sigla é apenas um nome, nada mais do que isso.
Cada um dos partidos, por força do acordo, sacrificaria uma candidatura a governo do estado: em Pernambuco, a jovem liderança de Marília Arraes (PT e líder nas pesquisas) desapareceria da cédula; em Minas Gerais, Márcio Lacerda (PSB, longe da liderança na corrida) deixaria de ser candidato. Depois da convenção do PT, no último fim de semana, Marília Arraes “foi desistida” da candidatura ao governo do estado e se tornou candidata à deputada; Márcio Lacerda entrou na justiça contra a intervenção no diretório mineiro do PSB e a questão certamente se espichará no tempo nos tribunais, sempre propensos a atrasos quando qualquer de seus julgamentos, mesmo sem base concreta, possa dar proveito ao PT. Afinal, juízes e procuradores odeiam o PT e o proclamam na sua “imparcialidade” jurisdicional. Ora, sem candidato, o PSB mineiro supostamente apoiaria do candidato do PT, Fernando Pimentel, e isto já basta para ir levando a decisão para depois dentro dos tribunais brasileiros. Na verdade, não acredito que o PSB mineiro, sem candidato, faça a campanha de Pimentel. Como provavelmente o PT pernambucano não fará campanha para Paulo Câmara…
Assim, toda a neutralidade em nome da unidade da esquerda gira de fato em torno de duas candidaturas a governos de estado: Fernando Pimentel quer ser reconduzido em Minas Gerais e está em dificuldades; com Paulo Câmara acontece o mesmo em Pernambuco. O resto, unidade e outros queijandos, são conversas fiadas. O PSB não ficará neutro nas eleições à presidência; os partidos que tiveram que retirar candidaturas aos governos estaduais não apoiarão de fato os candidatos que as siglas, em seus acordos nacionais, decidiram que devem ser apoiados.
Aliás, Carlos Siqueira, presidente nacional do PSB, quase diz isso textualmente. Depois de dizer que a política é força, quem tem menor força deve se juntar a quem tem maior força”, afirma que Ciro Gomes não conseguiu construir unidade na esquerda. “O problema não está no Ciro, mas no PT e nessa visão exclusivista deles”, ou seja, mesmo depois de acertados os ponteiros de sua neutralidade, o presidente vem dizer que a unidade não foi alcançada por Ciro Gomes por culpa do exclusivismo petista…(cf. www.brasil247.com/pt/247/brasil/364154/Lula-é-o-único-líder-popular-do-País-diz-presidente-do-PSB.htm?utm_source=Brasil+247&utm_campaign=a8b5ae8347-EMAIL_CAMPAIGN_2018_08_05_11_53_COPY_01&utm_medium=email&utm_term=0_d138bc98c5-a8b5ae8347-26717197 )
Haja neutralidade… haja unidade… Nenhuma nem outra foi conquistada com este acordo esdrúxulo!
João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.
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Prezado professor João Wanderley Geraldi, a realpolitik sempre traz desânimos, afinal o mundo ideal encontra seu limite na realidade (assim com a superestrutura “esbarra” na base material, lembraria o nosso grande mestre Flavio Bettanin, em seu longo retiro no lado de lá do Mampituba), o dever-ser disputando com o ser (e aquilo que pode ser). De qualquer sorte, não há como construir uma utopia sem tencionar o “topos”. E é isso que o teu (sempre bem elaborado) texto faz.
Por outra banda, penso que outras reflexões também são possíveis de extrair desses episódios (não se pode esquecer que no Amazonas, para “atrair” o PCdoB, o PT também fez sacrifício regional, tal qual em Pernambuco, o que, aliás, contradiz a afirmação de que o partido da estrela sempre impõe sua hegemonia, nunca sede). Uma delas é a enorme dificuldade que se tem de, aqui no Brasil, fazer valer interesses nacionais em relação aos regionais (e aqui falo de interesses legítimos, bem entendido).
Nisso, trago um elogio ao PT. Embora com seus erros e defeitos, o PT tem conseguido ter um discurso mais universal e menos local se compararmos com outras legendas partidárias de grande porte (não falo de pequenos partidos, porque aí é mais fácil “compor”, numa diversidade menor tem-se uma “natural” redução de contradições e da “dialeticidade”). Registro que não estou aqui desconstituindo a importância das lutas locais, mas não de pode ignorar que elas, muitas vezes, contrariam lutas universais.
Não vou me estender mais. Em outra oportunidade aprofundo tema, em escrito próprio.
Prof. Geraldi,
tenho estado ácida demais, PT faz seus acordos que além de rifar uma candidatura como a de Marília Arraes, e tudo que esta representa enquanto protagonismo de gênero e geracional, apoia golpistas natos, isso para mim é o imperdoável, esses acordos que costumo chamar pelo mesmo nome de uma cerveja, que dizem aumentar a produção de leite nas mulheres paridas, nos levaram a sede da pf em curitiba, além disso a fé quase romântica na legalidade me deixam arruinada… vejo que você segue mais firme, bom ler pra ter alento
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