No próximo sábado entra em vigor o retrocesso nas relações de trabalho, a chamada Reforma Trabalhista, a temerosa. Tal como seu patrocinador, que entrará para a história como aquele que revogou a Lei Áurea, a reforma não tem apoio popular. Pesquisa encomendada pela CUT, e realizada pela Vox Populi mostra que para 67% dos entrevistados, a reforma é boa para os patrões; e para 15% deles, não é boa para ninguém!
Dentre as pérolas introduzidas pelo que alguns parlamentares e analistas da grande imprensa chamaram de “atualização” da CLT, está o trabalho intermitente. Esta possibilidade é uma das piores inovações. Só perde mesmo para o princípio de que “o acordado vale mais do que o legislado”, princípio que dispensa a existência do próprio Legislativo, que ao assinar a reforma trabalhista se desincumbiu de elaborar e aprovar leis que remetam à relação patrão/empregado. Ou seja, não precisará mais se preocupar com estas “coisas menores” para se dedicar exclusivamente às causas maiores, quer dizer, à venda de seus votos, negociada a cada novo projeto do Executivo. Isto os ocupa em tempo integral. Vai daí que é bom para eles introduzirem no direito esta excrescência de que a lei não vale se houver acordo em contrário.
A pérola do “trabalho intermitente” é bem conhecida por nossa categoria. Professores têm contratos, no serviço público, que preveem 40, 20 ou 12 horas de trabalho em suas disciplinas, e nem todas estas horas são em sala de aula, conquista demorada da categoria para ver reconhecido o trabalho que ocupa o professor fora da sala de aula.
Mas os professores das escolas particulares são contratados por hora-aula (é rara a escola que contrata por turno ou em tempo integral). E isto vai do ensino fundamental, do médio até chegar ao ensino superior. Trabalham-se tantas horas em sala de aula; recebe-se por estas tantas aulas. O contrato do próximo ano dependerá do número de matrículas, da permanência das condições econômicas, etc. Como se sabe, a classe média baixa, quando se aperta, a primeira coisa que faz é transferir seus filhos para a escola pública… e isto reduz o número de turmas, reduzido o número de turma, reduzidas serão as horas-aula, e reduzidas estas, reduzido será o salário do professor.
Este princípio do “só uso quando preciso” que nós, professores, conhecemos bem, agora se tornou modelo para contratações: a partir de sábado ou de segunda (porque os estudos dos executivos das empresas já estão prontos para serem postos em prática assim que a lei entra em vigor), muitos trabalhadores serão chamados individualmente para negociarem seus novos contratos! O pior deles será o “trabalho intermitente”. Se reunirmos a esta pérola o princípio do “acordado”, poderão ser fechados “acordos”, isto é, em situação de desemprego, o empregado “será convencido” a assinar o que não quer, acordos de trabalho intermitente por duas horas, quatro horas, ou seja lá o que for, a serem cumpridas quando o patrão chamar porque estará precisando.
Isto poderá criar situações tão absurdas quanto um trabalhador ter que estar à disposição do empregador, por contrato, no horário em que este quiser, no dia em que quiser, na semana em que quiser (se o acordo for por horas mensais). E estar à disposição significa não ter outra ocupação que não possa ser imediatamente abandonada quando soar o chamado de ‘deus’… isto é, a necessidade do empregador. Tudo por força do acordo!
O modelo do professor-horista foi, portanto, extremamente aperfeiçoado! O que já é ruim sempre pode ser piorado quando se reúnem, em nome de uma ciência que eles consideram exata, mas que nem pode ser reduzida ao positivismo da modernidade, como reconheceu Kant, porque é uma ciência política, os bruxos fazem magias e pioram, pioram, pioram. Os sustos dos professores eram relativos ao próximo ano letivo (às vezes, também há reduções de turmas no fim de um semestre). Com o aperfeiçoamento dos bruxos, o susto será constante porque a qualquer momento você poderá ser chamado para um “novo acordo”.
Considerando que também os empregadores andam com a corda no pescoço, explorados pelo capitalismo financeiro, e que tudo isso é uma transferência da conta para os mais pobres – afinal, sempre coube a eles pagar a conta, resta a pergunta:
Quem de fato sai ganhando?
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