Enfim, chegamos ao lugar comum.
Explico-me sem grandes pretensões, o que não significa que não tenha cá meus objetivos. É sobre previdência que tratarei hoje. E como sou leiga no assunto posso falar sobre expectativas que passei a nutrir sobre o assunto, desde que foi colocado na ordem do dia, melhor seria eu ser a expressão: balcão governamental.
Muita gente não entende, e não vai. A juventude negra, em especial a urbana, assim como indígenas e quilombolas tem como expectativa uma vida curta em qual não cabe se aposentar, na real? Durante muito tempo sequer trabalho formal, assim como postos de trabalhos mais avançados. Era muito sonho pra quem tinha o pé no chão.
Então porque reclamar agora que uma parcela de trabalhadores não vai conseguir se aposentar? Porque devemos nos unir prioritariamente a essa pauta? Eu que já tive tantas vagas, ambientes e oportunidades retiradas pela minha pele escura, pelos meus cabelos arrepiados e indomados, pela minha boca grossa. Eu que abaixo minha cabeça frente às mentiras que contam para justificar a minha ausência na lista vip.
Não me entenda mal, eu sei que é preciso lutar por todos nós. Mesmo quando o nós não é tão nós assim, é muito mais nó na garganta. Veja bem, uma massa inteira precisará de um pouco mais. Até os que não sabem que no final do arco- íris não tem pote nenhum. Empreendedorismo tupiniquiquim? Eu sei bem. Vou ser honesta, como há algum tempo tenho sido, se você quiser manter o respeito e até apreço pode parar por aqui.
É certo que a negritude vai somar força, nas pioras e derrotas somos a grande maioria, mas aprenda bem como é se aquilombar. Vamos nos unir porque seremos como sempre fomos os primeiros da fila das mazelas. É preciso que se diga, que para muitos trabalhadores, desempregados, subempregados, terceirizados, precariados: A aposentadoria não vai acontecer. Pensando bem, a gente já sabe disse quando as leis trabalhistas foram subtraídas, parece-me agora a lei do sexagenário: “Liberdade ainda que tardia” é uma falácia. Queremos ser livres agora, já.
Nunca nos demos conta do absurdo que foi sessenta anos sendo escravizado, para depois sair com a mão na frente e outra atrás, sem nada, nenhum direito, sequer teto ou chão. Não é tempo de recomeçar. Não cuidamos de nossos fantasmas e eles voltam a nos visitar, e o pior se autoproclamam (termos atualizados) convidado de um banquete de misérias e fracassos que sentarão junto aos nossos filhos e aos filhos destes. Assim sendo, eu sei a hora de falar sobre o que quero, não me diga qual a pauta do dia, e sobre o que realmente eu devo escrever ou falar, a minha urgência antecede a sua em séculos que andei sozinha, e se agora voltamos ao tempo da escravidão, de matar negros ao bel prazer da branquitude e do mercado, e acrescentou-se a isso a inseguridade social, não há pauta mais ou menos importante: Aprenda!
Se assistimos a previdência tornar-se uma esperança quase religiosa e post-mortem, e dada à apatia e ao desconhecimento um fator contrarrevolucionário, há muito trabalho para ser feito, e temos lutado para colocar essas discussões na ordem do dia, sob o nosso prisma.
E durante muito tempo não foi possível, assim construímos nossas mentiras de cada dia, não reparando nas nossas próprias contribuições para o caos. Quantos trabalhadores ajudamos a manter na informalidade, com nossas desculpas esfarrapadas, com nossa economia sovina? Quantos rapazinhos do almoxarifado poderiam ter aquele pedido de atenção especial que foi dado aos seus filhos e filhas? Mas sempre tem a exceção. E nem todos nós fazemos isso, só alguns.
Existe um déficit na previdência, e os juros que pagamos são exorbitantes. É real. Assim como existem bancos que tem os lucros anuais em torno de bilhões devendo a previdência, como eu disse acima, entendo pouco, e assim como eu, são milhões de não entendedores, e talvez não dê tempo da gente entender sem muito perder antes. Porque muitos de nós não queremos explicar, despidos de nossos preconceitos e de nossas sabedorias, e preciso falar não como quem fala com quem será lesado, mas com quem sempre foi, mas que poderá compor junto conosco as filas das misérias, falar sobre como é difícil não ter garantias no futuro com quem sabe disso desde a origem.
Explicar porque o governo consegue pagar a previdência e garantir minimamente a dignidade humana de todos. Falar sobre coisas que eles nem imaginam, mas que você sabe como funciona.
É sabido que dá pra aumentar a arrecadação com mais gente trabalhando e contribuindo para a previdência, se o governo for competente, consegue garantir postos de trabalho e quando for possível alavancá-los, negociar com devedores, ao tempo em que se é enérgico em cobrá-los, e ao fim e a cabo se for preciso aumentar o tempo de contribuição, porque não diminuir nos últimos 10 anos a jornada de trabalho? Embora ainda não esteja convencida dessa ardilosa proposta.
Hoje estou danada a especulações, então mais uma não nos fará mal algum: é preciso colocar na pauta do dia a redução da jornada de trabalho – essa sim deveria ser a pauta atual. Se diminuíssemos a jornada, sem prejuízo salarial, talvez mais trabalhadores fossem inseridos em postos de trabalho e teríamos mais contribuição previdenciária e mais tempo cotidiano para ser livres durante a vida.
É preciso ser livre antes dos sessenta, na verdade o que disse acima coaduna com o que Lula disse de sua cela em Curitiba. Não é contraditório que um homem livre consiga pensar além das grandes, já os homens vis são presos aos seus próprios demônios e mesquinharias.
Lula livre já!
Professora, militante, escritora
Mara Emília Gomes Gonçalves é formada em Letras pela Universidade Federal de Goiás. Gestora escolar, professora, militante, feminista, negra. Excelente leitora, escritora irregular. Acompanhe-a também em seu blog: LEITURAS POSSÍVEIS.
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