PRESIDENTE TRAÍRA MERECE MINISTRO GRAVADOR

O ex-ministro da Cultura, Marcelo Calero, acabou dando uma de Juruna, o deputado indígena que andava sempre de gravador em punho para registrar palavras de branco, porque palavra de branco, branco esquece.

E gravou Geddell Vieira Lima, agora já ex-ministro mesmo tendo recebido no começo da semana todo o apoio incondicional do presidente Temer. Parece que agora, o Excelentíssimo Senhor Presidente – aquele que não levará desaforo para casa, no que faz bem, que Marcela não merece – está tomando do veneno que ele mesmo sempre fabricou: o fuxico. E quem é traíra merece ministro gravador de conversas…

Quem diria! Um ministro um tanto apagado, sem apoio na classe artística, que assumiu um ministério que o presidente queria extinguir. Pois justamente de onde não se esperava, vem o golpe de misericórdia num governo ilegítimo que sobe na crista da onda falsa de combate à corrupção, encarnada no herói nacional fajuto, o juiz de Curitiba, aquele que de fato está fazendo o trabalho solicitado pela matriz de destruir concorrentes das empresas norte-americanas, particularmente em obras no Oriente Médio.

Pois Marcelo Calero entrega voluntariamente à Polícia Federal as gravações que fez. Se fossem gravações contra qualquer petista, teriam grande valor para a investigação criminal. Como é gravação de ministro, registro da fala de seu superior, provavelmente será descartada enquanto prova jurídica. Mas isso já não importa: o estrago político está feito. Temer pode espernear, mandar assessores dizerem que agiu como estadista, pedindo o envio do assunto para a AGU (onde manda um aliado de Geddel).

Não se sabe o teor das gravações. Que o ex-ministro Geddel pressionou, não há dúvidas. Ele o reconheceu implicitamente quando nos meios de comunicação defendeu que em situação de crise deve se incentivar negócios… mesmo com riscos para o patrimônio cultural brasileiro.

Geddel já perdeu o apartamento. A obra não sairá do papel, depois deste escândalo todo, envolvendo o próprio presidente. Agora a crise está no gabinete de Temer. Que terá ele dito a Marcelo Calero? Não sei se algum dia saberemos… e se o que vier a ser “vazado” da PF não será precisamente o que interessa vazar, como sempre. Editada a fala, para garantir a continuidade do governo moralista e moralizante de cuecas que hoje dirige o executivo, saberemos apenas o que nos deixarem saber… Mas ficaremos com a pulga atrás da orelha, porque temos o dever de desconfiar necessariamente do que nos dirão.

Particularmente agora, em que tucanos de bicos longos vieram a público defender Temer. Aécio, aquele mesmo sempre delatado e jamais investigado, já disse que seu partido continuará apoiando Temer. O estadista de Higienópolis, fazendo biquinhos, veio à TV para dizer que Temer representa a ponte de que dispomos para a travessia do rio, e que sem esta ponte cairemos todos no rio… Como ele é sábio em suas analogias. Um pensamento brilhante ofusca todo repórter imbecilizado de nossa mídia! Ficam encantados. Aliás, estão sempre propensos a encantamentos quando o biquinho aparece: uma questão de servidão voluntária.

Mas o bom mesmo é ver o circo pegar fogo e ficar rindo do camarote! Bem feito! Temer merece um ministro traíra. Ele é traíra, e asinus asinum fricat. Os semelhantes se juntam e acabam produzindo provas contra o parceiro de ontem, inimigo de hoje.

Quero continuar a ouvir o silêncio das panelas, quero continuar a enxergar o verde-amarelo recôndito ao lar, recatado; quero continuar estranhando que haja uma INSTITUIÇÃO tão profundamente dona do país, que delegados da PF estejam nas redes sociais convocando para manifestações no dia 04 de dezembro contra o corrupto Parlamento de que se serviram para praticar o golpe do impeachment sem crime de responsabilidade. No primeiro domingo de dezembro haverá panelas e amarelos e bandeiras nas ruas.

Um político ingênuo – existe isso em Brasília? – não entenderá, afinal o golpe foi dado para anistiar a todos e parar com esta sangria! Os batedores de panela e até mesmo o santo juiz de Curitiba vão ter que reconhecer: a liberdade de investigar a corrupção era garantida precisamente pelo governo que eles tanto quiseram afastar. Bem feito mais uma vez!

E quero mesmo que o circo pegue fogo. Assisto de camarote. E o Nero são eles mesmos… Roma arde… aqui ardem outras coisas, das partes baixas de políticos corruptos que estão embasbacados e enrascados com o que fizeram “pelo bem da mãe, do tio, da avó, da mulher, do filho, do enteado” como foram os votos da ridícula sessão da Câmara no último abril, o mês que abre com o dia da mentira e que deu seu espetáculo notável dia 17.04.16. Mais um bem feito!

Kkkkkkkkkkkkkkkk sem dó nem piedade. Apareçam paneleiros de corpos esculpidos nas academias. Batam panelas. O MBL os protegerá, já que se transformou em milícia…

João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.