PARA ENTENDER O BRASIL E O MUNDO

Está dolorosamente difícil de compreender e entender o momento histórico do Brasil atual, se não se examinar no conjunto e na totalidade dos vieses político, econômico, social, judicial, cultural e ideológico. A sociedade atual em que vivemos e que constituímos – conformados ou inconformados – merece, ou requer, exames e análises em profundidade para além das superfícies e das aparências dos fatos e das circunstâncias em que ocorrem os fatos definidores e determinantes desta conjuntura do Brasil atual. Aliás, do mundo inteiro atual. É preciso examinar as relações das forças políticas, econômicas, sociais, culturais e ideológicas que constituem este momento histórico, e sempre em sua totalidade e em suas relações. Trata-se de uma análise em profundidade das relações infinitas e das forças em jogo, em confronto, principalmente quando o bloco histórico no poder camufla, fetichiza, fantasmagoriza a realidade de “ordem e progresso”, “harmonia constitucional dos 3 poderes”, com palavras e imagens falsas, mentirosas sob a tecnologia, o mando e o comando das elites do capital nacional e internacional, mediante estratégias de inculcação e reprodução da ideologia conservadora dominante, pelo uso  e abuso exclusivos da mídia planetária.

Para quem examina, analisa e pretende compreender a situação do momento da nossa história, precisa “deixar-se envolver na rede das relações”. Precisa ser ator real – cognoscente e cognoscível, sujeito e objeto – e examinar o mundo no grande horizonte para entender o local e o imediato numa visão pluralista e multifacetada de mundo, impreterivelmente na multiplicidade das relações. Pois, trata-se de uma situação de um “sistema de infinitas relações de tudo com tudo”, do jeito que Ítalo Calvino já percebeu na história do seu tempo. Assim, ele nos deixa uma advertência inteligente e sutil, segundo a qual não é possível compreender a nossa vida pessoal e individual, a existência própria, nem compreender a sociedade da qual fazemos parte se não for na totalidade das relações. Gostando ou não gostando, conformados ou inconformados. É uma questão de método de análise. E por tratar-se de método, diante da multiplicidade de métodos de análise, de interpretações, de compreensões e de explicações dos sentidos dos fatos da história, o método de análise das contradições da realidade concreta é o método mais eficaz e eficiente. O método dialético nos permite compreender a “realidade como essencialmente contraditória e em permanente transformação”, na acepção de Leandro Konder. É assunto para muitas e inacabadas controvérsias.

Na essência, as contradições emanam da estrutura da sociedade de classes sociais desiguais. Por conta e determinação deste modelo, desta arquitetura de sociedade, vivemos sob o reinado, sob o império, sob a ditadura, sob o totalitarismo globalizado do consumo. Tudo das nossas vidas e para as nossas vidas virou mercadoria. E cada ser humano vivo vale pelo que e o quanto produz e consome. Fomos infectados, contaminados pelo vírus do verbo comprar. Conjugamos o verbo comprar a todo momento das nossas vidas, nos orgulhamos dos nossos atos de existir e falamos: “eu comprei”, no passado; “eu compro”, “eu estou comprando”, no presente; “eu comprarei”, “eu vou comprar”, no futuro. Vivemos o mito da felicidade pelo prazer e pelo conforto do consumo de mercadorias e serviços sem limites.

Por acaso, não seria a hora, o tempo de encararmos a realidade das nossas vidas coletivamente? É possível, e como, propor transformações desta sociedade? Não seriam o conhecimento e a consciência coletiva os embriões e as armas do povo para os movimentos sociais transformadores? Questões para pensar. E agir.

José Kuiava Contributor

Professor, pesquisador, escritor
José Kuiava é Doutor em Educação pela Faculdade de Educação da Unicamp (2012). Atualmente é professor efetivo- professor sênior da Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Planejamento e Avaliação Educacional, atuando principalmente nos seguintes temas: autobiografias.inventário da produção acadêmica., corporeidade. ética e estética, seriedade, linguagem, literatura e ciências e riso.