“Quem não ama o bem?” Leônidas Andreiev é perspicaz ao iniciar seu conto “ A conversão do Diabo” com esta pergunta. Inoportunamente, poderíamos fazer a pergunta do seu contrário, do seu oposto, assim falaríamos o mundo dialético dialeticamente. A pergunta seria: quem não rejeita, não odeia o mal? Se todos, absolutamente todos os seres humanos, já em idade de juízo, tivéssemos que responder estas perguntas, o que diríamos? Com certeza, diríamos que amamos o bem, quer dizer, glorificamos os bons, os honestos, os justos, os leais, os que dizem e proclamam a verdade, os amorosos, os solidários, os que cumprem as leis, os que pagam os impostos, os trabalhadores, enfim, todos os dedicados ao bem. Diríamos, também, que odiamos, rejeitamos e condenamos o mal, ou seja, os seres humanos ruins, os criminosos, os perversos, os corruptos, os ladrões, os sonegadores de impostos, os subordinadores, os mentirosos, os assaltantes, os assassinos, os impostores, os injustos, os falsos, os exploradores das forças de trabalhado dos outros. E estas respostas seriam verdadeiras na teoria e na prática, na vida real existencial? Ou seriam respostas de aparência?
Bem, e por falar de aparência, a lavagem a jato de carros, máquinas, pisos, paredes, prédios é uma lavagem por fora, externa, rápida e apressada, quer dizer, uma lavagem de aparência. Deixar limpo e bonito na superfície. Nas lavagens a jato são usadas máquinas e equipamentos de alta tecnologia, que ejetam água e ar em alta pressão, via de regra, com água ensaboada. Tudo precisa ser rigorosamente fechado – portas, janelas, vidros, capôs, telhados – para não penetrar água no interior dos carros, das máquinas e equipamentos, nos prédios. Em suma, o interior não é lavado quando se lava a jato. O interior dos carros fica sujo, embarrado, empoeirado, malcheiroso. Quem vê o carro lavado a jato fica encantado pela limpeza e beleza externas, de aparência.
E a Operação Lava Jato, o que é? Quem deu esse nome e por que? Em quais circunstâncias e situações históricas reais foi instituída? Em que conjuntura política foi instituída a Operação Lava Jato? Quais as intenções e as finalidades enunciadas (falsas?) e quais as finalidades ocultas (verdadeiras?) intencionavelmente sigilosas?
Se a analogia da denominação fosse interpretada em seu sentido literal – redes de postos de combustíveis e lava a jato eram usadas para lavagens de dinheiro em bilhões de reais provenientes ilícita e ilegalmente da Petrobras – a Lava Jato danificaria, destruiria por completo as cédulas de dinheiro de papel, que não estavam sujas realmente, mas tomadas de maneira suja. Porém, “lavar dinheiro” – fazer “lavagem de dinheiro” – é uma analogia que significa “legalizar” dinheiro roubado das contas do Estado, por intermédio e ação de empresários, políticos, operadores financeiros, funcionários públicos, com aquiescência do Poder Judiciário. Nos quinhentos anos de história do Brasil, a Operação Lava Jato é a primeira e única em sua intensidade e seu tamanho. Alguns especialistas e entendidos em assuntos de corrupção andam dizendo e anunciando que a “Operação Lava Jato” é a maior ação de investigação, condenação e prisão de corruptos que o Brasil já teve. Não que o Brasil não tivesse corrupção, roubo, “lavagem de dinheiro”, “caixa dois”, ao longo dos seus tortuosos caminhos políticos. Fato interessante, a “Lei Anticorrupção” foi aprovada recentemente – 2013 – e instituída e deflagrada em março de 2015, por mérito do governo dos trabalhadores.
Mas, o nó da questão não está nesta imagem da aparência do poder soberano – poder de toga – do Juiz Sérgio Moro. A questão está na esfera ideológica onde, nesta escala, a Operação Lava Jato esconde, oculta a sua essência, o seu modo de agir como campo de batalha e de luta pela hegemonia da classe dominante, ao gosto e sabor das organizações empresariais das elites do capital, das organizações políticas neoliberais e da grande mídia, esta, a imprensa, de poder supremo na manipulação dos fatos para a formação da opinião pública. Neste campo de batalha das denúncias, das “delações premiadas”, das provas materiais e testemunhais, das defesas, das notícias à opinião pública, dos julgamentos e condenações, as elites precisam se manter coesas enquanto bloco histórico do poder. Elas, as elites, precisam da hegemonia – poder e direção – consentida pela aliança da sociedade política e da sociedade civil nas instâncias do poder do planalto – Executivo, rigorosamente imbuído de autocompetência e vestido de terno e gravata; Legislativo, de uniforme da democracia plena na compra e venda dos votos; Judiciário, de toga e poder soberano, condenando os políticos das classes trabalhadoras, inocentando e absolvendo os corruptos, os corruptores e os ladrões de terno e gravata. É verdade, a Operação Lava Jato é um fato histórico autêntico de investigação e conjetura de seletividade dos crimes de políticos e empresários, em que o critério de condenação ou absolvição é a vinculação de classes sociais dos acusados e investigados. A prova está na expressão dos juízes: “isso não vem ao caso”, quando o acusado é do PSDB, PMDB, DEM … e a condenação dos acusados do PT, mesmo sem provas reais e verdadeiras.
Agora, falando numa linguagem clara, exata, visível e consistente, é preciso dizer, salvo engano, que a Operação Lava Jato foi concebida e nasceu como “Lei Anticorrupção” e logo, após a derrota dos neoliberais nas urnas, sob o comando, a investigação e o julgamento do supremo poder de toga de Sérgio Moro, se metamorfoseou em operação para destituir o PT do poder da nação – classe dos trabalhadores – primeiro com o golpe do impeachment destituindo a Dilma da Presidência, sob a falácia da democracia constitucional, agora, de forma cada vez mais nojenta, a Operação Lava Jato quer impedir o Lula a voltar à Presidência em 2018. Enquanto isso, Temer conseguiu a união quase total dos brasileiros: mais de 95% querem sua condenação.
O resto, a história contará
Professor, pesquisador, escritor
José Kuiava é Doutor em Educação pela Faculdade de Educação da Unicamp (2012). Atualmente é professor efetivo- professor sênior da Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Planejamento e Avaliação Educacional, atuando principalmente nos seguintes temas: autobiografias.inventário da produção acadêmica., corporeidade. ética e estética, seriedade, linguagem, literatura e ciências e riso.
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