Sardenberg, durante os governos populares (Lula e Dilma) até o golpe, vinha com seus comentários econômicos afirmando o que ocorreria no dia seguinte nos territórios de seu deus, o mercado. Dava sempre ares de bem informado. Mas quase que diariamente tinha que repetir a mesma frase: o mercado não reagiu conforme o esperado. E sempre com os mesmos ares de bem informado pelo mercado, profetizava nova bomba para o dia seguinte, quando novamente teria que dizer “o mercado não reagiu conforme o esperado”. Quem tem ouvidos, ouviu e passou a desrespeitar o comentarista. Menos a Globo que continuou e continua a apostar na sua “competência”…
Acontece que ele sempre quer dar outras tacadas, comentando o que não é sua alçada (aliás, nem a economia é de sua alçada pelos erros de suas profecias, inclusive aquelas de que, afastada Dilma, o mercado floresceria, o emprego estaria disponível para todos, enfim, a felicidade chegaria aos arraiais brasileiros).
Um destes comentários que acompanhei foi sua espinafração ao livro didático que não leu, e de que não se deu o trabalho – como toda a grande imprensa – de virar a página. O tratamento das variedades linguísticas: o respeito pelos diferentes falares preconizado no livro foi espinafrado por este ignorante sobre qualquer coisa a respeito dos fenômenos linguístico. Na época, escrevi-lhe sobre seu artigo publicado no Estadão. Explicava-lhe o que são variedades e pedia-lhe que virasse a página do livro que criticara, pois na página seguinte as autoras, lúcidas, chamavam atenção para as relações de poder envolvidas na linguagem e a imposição do modelo padrão, este mesmo que vive se modificando apesar dos sardentos comentaristas.
Pois mereci uma resposta: “Logo vocês estarão ensinando a falar e escrever errado.” Nem respondi, porque em cabeça dura, mesmo pingando água mole diariamente, nada entra…
Agora ele repete, com aprimorada ignorância, o mesmo estilo. Vem dizer que o Comitê de Direitos Humanos da ONU não significa nada, confunde-o com o Conselho de Direitos Humanos – ambos órgãos da ONU que prestam contas à Assembleia Geral – e vai por diante, para tentar “enquadrar” a compreensão do requerido pelo Comitê: que o país tome as providências para que os direitos do cidadão Lula da Silva sejam respeitados e que ele possa concorrer à presidência nas eleições deste ano.
Aprimorada ignorância mostrada em público tem suas razões: estão em desespero. O golpe, com o Supremo e tudo, somente acumulou fracassos: o fracasso do programa econômico de Aécio Neves, tão aplaudido por comentaristas sarnentos e recusado nas urnas, mas posto em prática pela equipe de Temer; o fracasso na reforma do Ensino Médio; o fracasso da reforma trabalhista em que o acordado vale mais do que o legislado; o fracasso na tentativa de restabelecer o trabalho escravo nas fazendas e nos rincões do agronegócio; o fracasso retumbante na arena política, onde todos fogem de Temer e correm cada um para seu lado; o fracasso no tal combate à corrupção, quando vem à público, pela voz de Tacla Duran, que há negócios na indústria da delação premiada… tudo fracasso!
Mas como eles têm ares de “bons sujeitos” – ao velho estilo de FHC que agora vai o jornal O Globo para mostrar seus receios com o fascismo que ajudou a emergir – estão agora com medo de um governo fascista (que poderá se dar ares de nacionalista) ou de um governo popular. Nenhum deles lhes interessa, por enquanto. Assim que o mercado migrar para o fascismo burro representado por um candidato imbecilizado, os sarnentos e “bons moços” começarão a dizer que não é bem assim, que as propostas econômicas são boas, que haverá com o fascismo garantia de combate à corrupção, etc. etc. A mesma lenga-lenga que ouvimos sempre que alguma política de construção da cidadania comece a ganhar espaço neste país de escravocratas, vivam eles nas velhas casas coloniais, ou vivam eles nos gabinetes dirigentes da indústria, do comércio e da exploração em negócios de atravessadores. Sempre terão na cidade letrada a seu serviço: há sarnentos para tudo e para todos a emprestar pena e inteligência.
Depois, muito depois, como fez O Globo, Sardenberg sairá dizendo, diante dos novos fracassos, ajoelhado ante seu deus, “o mercado não reagiu conforme o esperado”. Esperado por quem? Pelo Senhor, o comentarista de plantão, que não acerta profecia alguma, nem para o bem quando tirou calças e cuecas para defender Meirelles no Ministério da Fazenda, nem para o mal quando previu catástrofes sobre catástrofes nos governos populares de Lula e Dilma.
João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.
O texto do Sardenberg foi repetido de propósito, ou houve erro de digitação?
Obrigado pelo aviso. Vou verificar com o Alexandre Costa, que posta os textos, para ver se a desconfiguração se deu na postagem ou se ao anexar o texto ao email. Está repetido e dentro de um parágrafo. Ficou uma bagunça. Desculpe.
Parabéns pelo artigo. Precisamos dar um basta nessa turba de ignorantes e conservadores do nosso país e ao mesmo tempo esclarecer aos desinformados.