Uma empresa estatal do Paraná chamou Luiz Carlos Mendonça de Barros, economista, ex-professor e ex-ministro das Comunicações do governo FHC, hoje dono da Quest Investimentos, entre outras coisas, empresa influente no mercado financeiro, construída certamente com o capital amealhado com o salário de professor, para proferir conferência aos executivos da empresa, nos múltiplos treinamentos que se fazem hoje em qualquer organização. Era janeiro de 2014, ano eleitoral e o governador do Paraná iniciava a campanha.
Em palavras para este público (executivos) é que podemos encontrar o que efetivamente pensa a inteligência que pretende retornar ao governo de qualquer modo. Mendonça de Barros é economista ouvido por seus pares, hoje vinculado ao mundo do capital financeiro, com influência no que poderá ser o projeto de uma “nova política” para o Brasil.
Pois nesta palestra, intitulada “Brasil: o fim de um modelo ou um ajuste cíclico?”, Mendonça de Barros nos apresenta inúmeros dados expostos em tabelas. Destas, chamo atenção para dois de seus gráficos, um sobre o desemprego e outro sobre o perfil de renda da população, distribuída esta em dois grupos (faixas ABC / DE):
O primeiro gráfico nos mostra que desde 2004, estamos cada vez com menor taxa de desemprego. Ou se quisermos falar em termos positivos, houve um aumento contínuo de postos de trabalho nos últimos 10 anos.
O segundo gráfico nos mostra um período que vai de 1993 a 2011. Nele se pode verificar dois momentos distintos neste período: uma diminuição da pobreza entre 1993 e 1996, e depois um período de manutenção no mesmo patamar até 2003, quando começa um decréscimo significativo. Isto significa que o segundo mandato de FHC manteve estáveis os níveis de renda das classes DE; e que o governo Lula diminuiu sensivelmente a pobreza.
Os gráficos não trazem novidade: repetem o sabido. Mas são importantes porque elaborados num dos “quartéis generais” do pensamento neoliberal. E eles reconhecem a queda do desemprego e o aumento da renda dos brasileiros (uma distribuição mínima da riqueza nacional de forma minimamente mais equitativa).
O que interessa mesmo, para termos uma visão do futuro que nos promete este tipo de pensamento político e econômico, são as conclusões do Sr. Mendonça de Barros e suas propostas para que um novo modelo seja aplicado, acabando com este ciclo de distribuição da riqueza (diminuição da miséria) e de desenvolvimento interno com emprego (diminuição do desemprego).
O economista defende a tese de que o Brasil está no fim do ciclo de aumento do emprego, dos salários e consequentemente da renda. Para ele, o país precisa de um novo modelo, obviamente aquele preconizado pela política neoliberal. Assim, segundo ele, as “maiores taxas de desemprego até 2007 criavam alguma folga no mercado de trabalho permitindo a expansão do emprego sem forçar os salários. Essa capacidade ociosa não está mais presente”. Que isto quer dizer? Que é preciso aumentar o desemprego para que um suposto pleno emprego não force o aumento dos salários dos trabalhadores. Ou seja, melhor ter desemprego do que trabalhador bem pago. Uma taxa maior de desemprego permite baixas condições de negociações de salários. Que o digam os trabalhadores das pequenas cidades brasileiras que não tiveram o mesmo surto de crescimento que outras.
Por isso ele proporá, em suas próprias palavras, para política econômica brasileira dois caminhos que merecem o realce:
- O governo deve acelerar a exploração de serviços públicos pelo setor privado, principalmente no setor de infraestrutura; Políticas que aumentem a produtividade do trabalho também são necessárias;
- Será preciso retomar o controle dos gastos públicos e ancorar novamente o superávit primário, mesmo que em nível inferior ao que vigorou nos anos 2000; Adicionalmente, o governo deve adotar uma política menos agressiva de aumento real do salário mínimo para os próximos anos;
Infelizmente, o segundo mandato de Dilma, orientado por um economista da mesma escola de Mendonça de Barros, está realizando o projeto neoliberal. Mas a caneta continua fora das mãos do grupo político de que Mendonça de Barros é um dos gurus. E isto lhes é insuportável.
A questão a saber é: as multidões nas manifestações deste domingo concordam com este projeto para o Brasil? Sabemos que aqueles que irão às ruas no próximo dia 20/08 vão manifestar-se contra esta direção dos ajustes fiscais: mais desemprego, menos renda para o trabalho, e muito, mas muito mesmo, recurso canalizado como lucros para os bancos.
João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.
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