Foram-se os tempos em que o candidato Jair Bolsonaro mandava perguntar para o Paulo Guedes… Foram tantas as vezes que mandou perguntarem ao mago das finanças, que ele ganhou apelido: “Posto Ipiranga do Bolsonaro”. Não deve ser fácil a vida de um PIB: respondendo sem ter respostas, sem saber sequer que o orçamento público é elaborado num ano e executado noutro.
Mas o Paulo Guedes sabe muito, sobretudo, ele sabe a quem quer beneficiar. E sabe que tem um tempo para se beneficiar.
Desde que o estilo gestão CEO se tornou também a gestão da coisa pública, assistimos a estes desastres. Quando um novo CEO assume uma empresa, ele sabe que precisa responder com lucros imediatos para agradar aos acionistas, aos capitalistas que o colocaram na posição privilegiada de CEO. E então encurta prazos de projetos, corta custos e salários – para elevar seus próprios rendimentos. Em nome da ‘melhoria’ de qualidade, muda rótulos de produtos, diminui a quantidade e aumenta os preços. Se em cada potinho de iogurte ou cada litro de óleo comestível ele fizer o programa de retirar 0,1% do conteúdo ninguém notará, mas os resultados aumentarão. E aumentar os resultados nos balanços é o que garante sua permanência e também o valor do seu percentual sobre os lucros.
Pode fazer algumas coisas pouco decentes: se ele assumiu, por exemplo, uma empresa de telefonia, pode fazer um programa de ofertas de 100 ligações gratuitas em uma hora. O cliente é premiado com o que não vai usufruir, mas os ‘custos’ serão registrados como gastos de publicidade, descontados do lucro líquido, diminuindo impostos sobre lucros, e com isso aumentando lucros. Uma espécie de caixa-2 empresarial, suponho.
Nas contas bancárias, um débito de R$ 1,00 em nome de qualquer taxa terá no máximo 10% de clientes reclamando. Os outros 90% deixarão por isso mesmo… e o banco lucra milhões. Afinal, é de grão em grão que a galinha enche o papo dirá o CEO.
Mas isso tudo é parte da gestão. Pedro Parente a aplicou na Petrobrás, dizendo que seu compromisso era com os acionistas. Obviamente esquecendo que o maior acionista da Petrobrás é o povo brasileiro. Mas brasileiros, para CEOs, não existem. Existem acionistas. Não foi por acaso que Pedro Parente doou aos acionistas norte-americanos alguns milhões de dólares… tanto que até daria uma sobra de 2,5 milhões de dólares para a Fundação do Dallagnol, uma espécie de gorjeta sobre a qual a juíza Gabriela, aquela plagiadora, decretou sigilo e autorizou a transação.
Paulo Guedes sabe disto tudo. E apoia, afinal há que gerir com boa gestão os negócios. E Paulo Guedes sabe muito mais:
– ele sabe que políticas públicas criadas com base nestes desvios, no futuro criarão impasses na vida da população, como mostram os chilenos depois de 30 anos de modelo “CEO” de gestão;
– ele sabe que Portugal somente saiu da recessão econômica quando abandonou a receita neoliberal que aplica por aqui;
– ele sabe que os capitalistas são insaciáveis – como ele próprio é insaciável como mostrou na gestão de fundos – e que é preciso alimentar a goela dos tubarões para não ser engolido por eles;
– ele sabe que o neoliberalismo produz miséria, fome e desemprego no mundo inteiro, mas os balanços registram lucros extraordinários a cada semestre;
– ele sabe que toda esta riqueza de papel é virtual, não corresponde a bens materiais, mas isso não importa. A única coisa que não imaterial é a forme, a miséria, a pobreza, mas isso é consequência salutar do sistema.
E por tanto saber, Paulo Guedes resolve:
1. Roubar ¼ do salário dos servidores públicos municipais, estaduais e federais;
2. Roubar 7,5% do salário desemprego (seria cômico se não fosse trágico).
Mas Paulo Guedes sabe que para passar seus roubos ou taxas sobre a grande pobreza terá que pagar, e pagar muito bem, os membros da “base aliada” no Congresso. E pelo ralo se vai o dinheiro roubado dos pobres que devem pagar a conta: afinal nossos capitalistas precisam dos lucros para continuar suas vidas nababescas nos melhores lugares do mundo, onde vivem longe desta miséria e violência que constroem por aqui através de seus agentes, isto é, de seus CEOs.
João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.
Excelente texto, amigo Wanderley! Por isso que Paulo Guedes agora deixou de ser “posto Ipiranga” para se tornar um Robin Hood às avessas: tira dos pobres para dar para os ricos.