O paradoxo da investigação e da prática política da corrupção

Como sabemos todos, a menor distância entre dois pontos é uma curva. As curvas oferecem derrapagens. Desde a primeira vitória de Lula para a presidência que a esquerda derrapa, caindo na curva (e no engodo) da governabilidade segundo as regras do jogo sempre jogado na política brasileira. Até o operador deste jogo foi o mesmo: Marcos Valério. Esta ‘facilidade’ dispensou as tratativas políticas efetivas, de persuasão e construção de um projeto que fosse abarcando cada vez mais pessoas apostando no desenvolvimento com distrivbuição de renda. A ‘facilidade’ do desvio deu em desvio. A política do “tomá lá dá cá” voltou a reinar e para sustentá-la, nuca bastaram os cargos comissionados… Como já disse Ricardo Semler, nunca se roubou tão pouco num percentual de 1% quando o usual era 10%. Foi preciso encontrar um tesouro com que regalar apoiadores que discordavam do projeto mas que não queriam perder benesses do poder. E assim fomos nos associando não aos movimentos que levaram o PT à presidência, mas associando-nos ao que de pior a política brasileira tinha a oferecer. Lady Política Brasileira não é como o Minotauro com exigências mais ou menos definidas anualmente. Lady Política Brasileira é uma garganta profunda, sem fundo… e foi sendo necessário um maior tesouro para dar conta de suas ganâncias, quase explícitas.

A escolha deste desvio deu com os burros n’água. Poderia não ter dado? Sim. Bastaria manter a PF desaparelhada, sucateada, inerte. Faltou conversar com o Ministério Público. Sem engavetador geral da república e realizando concursos para profissionais de carreira, imbuídos de alguns ideais públicos, como deveriam ser todos os servidores públicos, nomeando juízes da suprema corte absolutamente não partidários (como é o juiz Gilmar Mendes, nomeado pelos que sabiam fazer as coisas), mantido o ideário de uma sociedade justa e sem ‘carteiradas’, construiu-se um paradoxo: manter a regra do jogo político sujo e corrupto em nome da governabilidade e defender uma sociedade livre do abocanhamento do estado por uma elite política desavergonhada. Deu no que deu. É impossível ao mesmo tempo lutar contra a corrupção e querer manter as regras do jogo político lastrado nos recursos da corrupção.

Quem se vende, sempre se vende pelo melhor preço. Neste contexto em que se aposta de modo duplo, chega-se ao impasse. E eis que até mesmo ‘companheiros’ de chapa se apresentam como “limpos, honestos, capazes” de recuperar a união de todos em benefício do Brasil. E se apresentam sem cara suja, desde próceres da situação (Michel Temer, por exemplo) até próceres da oposição (Aécio Neves, por exemplo).

 

João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.