O Ministério Público Federal está patrocinando o melhor do atual FEBEAPÁ – O festival de Besteiras que Assola o País. Que falta nos faz um Sérgio Porto que reúna os interesses lídimos e as “provas” concretas que vem apresentando o MPF à nação brasileira. Obviamente, os procuradores se lastreiam nas investigações profundas que realizam em conjunto com a Polícia Federal (e no caso do Tribunal da Inquisição de Curitiba, dirigidos pelo juiz que investiga, acusa e julga, o angélico Dr. Moro).
Eis o crime da ex-presidenta Dilma, em investigação instaurada pelo MPF: a morte de seu cachorro Nego, que com mais de 13 anos de vida e doença incurável foi encaminhado para a clínica veterinária, o que fazemos todos nós proprietários de cachorros quando o final se aproxima. Sei o que me custou levar meu Dudu, um pastor alemão, aos exatos 12 anos e 3 meses para a clínica: sabia quando o deixei lá que não o veria novamente. E nunca mais quis ter cachorro!
Mas para o MPF, a Dilma é uma assassina sem alma! Matou com as próprias mãos, certamente estrangulando depois de submeter a maus tratos e muita tortura, o seu amado cachorro! Que se pode esperar da peça acusatória??? Algo semelhante, para desenhar uma monstruosidade para fins midiáticos? Ou se trata mesmo de compreensão especular dos acontecimentos? Tipo “eu faço assim, logo ela faz assim também”.
Quem diria! O cachorro Nego nega a inocência de Dilma! Afinal, como ela sofreu um impeachment sem crime cometido, há que achar outros crimes para compensar. Nada melhor do que a morte do cachorro, devem ter pensado os procuradores do caso. E lá vai investigação para forncer denúncia. Só que desta vez não encontraram o eco tradicional da mídia. Seu gosto pela ironia não chega a tanto.
Nem bem recuperados do susto, noutro processo aparece uma prova cabal de que Lula é o proprietário real do sítio de Atibaia, tornado famoso por causa dos pedalinhos de seus netos. A cadela Mel foi picada por jararaca! Teve dois atendimentos do veterinário, foi levada ao veterinário em março e novembro de 2012. E Dona Marisa Letícia pagou a conta com cheque de R$ 1.253,00. Pronto: o dinheiro veio de propina obtida em tempos indeterminados por ações inespecíficas em benefício da OAS, como constou na sentença condenatória assinada por um juiz (pasmem! Por um juiz”!) no caso do tríplex, de que Lula é o “proprietário real”. Vejam, senhores: são R$ 1.253,00, uma dinheirama. Perto disso, aquelas malas do Gedel em Salvador são uma ninharia! E o empréstimo do Joesley Batista ao ínclito senador Aécio Neves uma gorjeta! Repito: são R$ 1.253,00. Estou estupefato!
E dizer que o país gastou muitos contos de réis para que a PF e o MPF chegassem a esta prova conclusiva! Foram salários (e o dos procuradores são salários invejáveis, além dos pequenos auxílios que recebem!), passagens aéreas, transporte terrestre, diárias (há uma procuradora que recebeu mais de 50 mil reais em diárias na Lava Jato num ano). Mas o esforço nacional valeu a pena: eis que temos uma prova cabal, suficiente para afastar qualquer dúvida real: Lula é corrupto. Dona Marisa Letícia uma perdulária que gastou tudo… com a cadela Mel.
E isto tudo veio ao caso quando já não era mais necessário: o angélico juiz já havia despachado que, neste processo, não é necessário comprovar que Lula é o proprietário real do sítio de Atibaia. Basta demonstrar que ele foi beneficiado pelas benfeitorias feitas no sítio pela empreiteira. E como entre estas benfeitorias está uma reforma da cozinha, e como Lula foi 111 vezes ao sítio – um indício razoável de que é o proprietário para o péssimo leitor de Peirce e Ginzburg, o famosíssimo intelectual autor de uma obra inigualável, o conhecidíssimo Powerpoint – certamente estando no sítio, Lula fez alguma refeição, e como a refeição foi feita na cozinha reformada, num raciocínio lógico, sem qualquer perigo de ser uma falácia, Lula foi beneficiado pela reforma, e a reforma foi feita pela OAS, que é uma empreiteira, que prestou serviços a Petrobrás, donde se conclui que o dinheiro da reforma é propina. Bom, para ser propina é necessário que o beneficiado tenha prestado algum “serviço” ao corruptor. Mas comprovar este vínculo não vem ao caso! Basta dizer que a propina é resultado de ações inespecíficas pagas em tempo indeterminado. Ponto. Como se num raciocínio abdutivo, tudo pode ser dito a partir dos indícios (no caso, indícios fabricados oportunamente). Pobre Peirce! Pobre Ginzburg! Pobre Umberto Eco! Isso para citar apenas alguns dos autores que defenderam o paradigma indiciário, os mais conhecidos cá e lá, na matriz, onde se deu a formação intelectual de nosso exímio Dallagnol.
O Brasil está feliz. Enfim os procuradores encontraram as provas dos crimes dos dois ex-presidentes petistas: a morte do cachorro, a picada da jararaca na cadela. Enquanto rimos com esta alegria espantosa, vamos levando naquele lugar com a Reforma Trabalhista e com a anunciada Reforma da Previdência e, por baixo dos panos, vão vendendo o patrimônio nacional, isentando de impostos as grandes petroleiras e financiando com dinheiro público suas atividades! Mas isto, já nos ensinou o angélico, não vem ao caso.
Resta-nos conclamar: um “Viva” estrondoso aos procuradores do cachorro e da cadela!
João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.
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