O jogo de cena do TSE, a denúncia da FSP e os militares

Recebo, não sei bem a razão, comunicados de O Globo, dizendo “O Essencial da…”. Pois o de hoje pela manhã nada diz sobre a reportagem da FSP sobre o financiamento empresarial à campanha de Bolsonaro, com pagamento de milhões para disparar milhões de whatssapp. Ontem à noite, por curiosidade, ligamos a TV no pior jornal televisivo do país, o JN: apenas uma nota falando de “um suposto esquema de financiamento”… nada mais.

Para a FSP, que não gosta nada de Haddad, e muito menos ainda das forças que o PT aglutina,  publicar a reportagem da jornalista Patrícia Campos Mello (e dando manchete de primeira página) deve estar muito segura das fontes e dispor de documentos, porque a empresa dos Frias sabe como age o fascismo, com o qual colaborou durante a ditadura militar. Ora, um dos segmentos que de imediato serão atingidos por um governo de cunho fascista será precisamente a imprensa.

Mas é óbvio que as Organizações Globo não estão nem aí para isso: sabem participar dos golpes e se adaptar imediatamente seus passos de dança à música que será tocada. 50 anos depois, talvez, faça um editorial dizendo que foi um erro ter apoiado e ter dançado segundo o ritmo que ajuda a tocar diariamente.

Ou seja, não esperemos muita coisa da denúncia feita pela FSP, mesmo tendo sido o assunto principal das redes sociais no mundo inteiro. O #caixa2Bolsonaro continuará a disparar, do exterior, milhões de mensagens. E os bolsomínios, que consideram a FSP de esquerda – aliás, um prócer do MBL considera a Ku-Klux-Klan socialista, continuarão na sua imbecilidade cega e continuarão a praticar atos de violência durante a semana próxima: estão autorizados pelo judiciário.

Neste clima todo, de ebulição, a colegiada Rosa Weber convoca as duas campanhas para fazer um apelo para evitarem notícias falsas durante este processo eleitoral. Ao fazer isso, colocou as duas campanhas no mesmo nível como se ambas estivessem fazendo a mesma coisa! Ao mundo etéreo onde vivem os togados, os fatos desta campanha não chegam ou chegam com atraso: o mesmo TSE que determinou que a campanha de Bolsonaro pare de falar no inexistente kit-gay, foi capaz de “puxar a orelha” das duas campanhas, mas foi incapaz de chamar às falas a campanha que ele próprio considerou como veiculadora de mentiras!!!

O PDT pediu a anulação das eleições; o PT pediu investigação do financiamento irregular por empresas, citando inclusive algumas delas que estão desembolsando seus R$ 12 milhões para dispararem mensagens falsas. Alguém imagina que algum ministro do TSE tomará alguma medida preliminar, considerando a urgência das datas e da votação no dia 28 de outubro? Se alguém imagina isso, é inocente. Ora, seguindo os trâmites demoradíssimos com que caminham os processos, somente depois dos resultados das eleições e talvez até depois que o TSE proclame estes resultados e diplome o eleito, algum destes togados encaminhará o assunto para o arquivo, com base no mesmo argumento usado para salvar Dallagnoll e seu cargo de procurador: “é fato consumado”.

E por que interessa o fato consumado ao judiciário? Aí é que está no nó da questão que poderá abreviar decisões judiciais, que poderá cassar a chapa de Bolsonaro, que poderá fazer os togados agirem com presteza: os militares.

Os militares engoliram Bolsonaro, depois que o Mourão virou seu vice (não se sabe se imposto a Bolsonaro ou não). A imagem pública da instituição “Forças Armadas”, construída ao longo dos últimos 30 anos, é de uma instituição séria, atenta e honesta. Jogarão os militares este prestígio na cesta do lixo sendo conivente com a falcatrua eleitoral da chapa Bolsonaro/Mourão?

A denúncia da FSP deixou uma batata quente nas mãos das lideranças militares: fazer vistas grossas e manter a fraude destas eleições, para chegar pelo voto ao poder em que já estão; ou exigir pressa dos togados para que julguem imediatamente o assunto. Na primeira opção, sabem que estão fazendo vistas grossas e invocarão que não lhes cabe qualquer papel no assunto (ainda que todos saibamos que o Gen. Fernando Azevedo e Silva está no comando do STF); se tomarem a segunda decisão, novamente se abrem duas possibilidades – os togados deverão perguntar o que deve dizer o juiz-relator: considerar improcedente a denúncia e mandar arquivar os pedidos do PDT e do PT ou considerar procedente a denúncia e julgarem com base na lei o que se requer nas petições. Se a ordem for pelo julgamento da improcedência, por exemplo, por falta de provas, os militares poderão falar grosso: decisão dos tribunais superiores devem ser respeitadas e as Forças Armadas, responsáveis pela ordem, estarão de prontidão para garantir os resultados espúrios das eleições deste ano.

Infelizmente, pessimista como sou, penso que este será o caminho: a garantia da eleição da chapa Bolsonaro/Mourão para que o Gen. Mourão governe o país com o apoio irrestrito das Forças Armadas e dos seus subordinados de ocasião: o STF, o TSE, o STJ, os TRFs, etc. etc. tudo dentro da legalidade, sem qualquer ‘golpe de estado’, porque este não houve nem em 2016, como se recusa a admitir certa imprensa e certo boneco que ocupa o Planalto no momento.

João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.