O Felipe, menino de oito anos, aluno do 4º ano do ensino fundamental, leu os 12 Volumes de “Diário de um Banana” – Jeff Kinney – em dois meses, no total de 2.240 páginas. Uma leitura visual de texto impresso em papel – livro – portanto, não foi uma leitura de escuta auditiva, nem uma leitura virtual de tela eletrônica.
Neste tempo, o Felipe frequentou o colégio, está escrevendo o diário “A Saga do Felipe”, título que ele mesmo inventou, brinca com amiguinhos e amiguinhas no condomínio onde mora, desenha e pinta inúmeros quadros, e se diverte com jogos online no celular.
Todas e todos coleguinhas da sala do Felipe estão lendo visualmente o “Diário de um Banana”, conversam, comentam e inventam muitas histórias, interagem e compartilham muito as interpretações segundo a imaginação de cada uma e cada um. É claro, motivados, estimulados, animados pela professora.
Todas e todos tem e usam celulares. Aí fica a pergunta: a leitura visual de textos escritos – livros, gibis, revistas – está em plena, cabal e irreversível extinção? A “pedagogia da imaginação”, proposta por I. Calvino, está viva, hoje, no mundo criativo das crianças, ou estaria sendo devorada pela fantasia e ilusão do mundo do WhatsApp?
O império sedutor das maquinarias eletrônicas estaria aniquilando a imaginação, a criatividade e a vivência da estética na literatura, nas artes – pintura, música, dança – e nas brincadeiras corporais – parquinhos, playgrounds, esportes, jogos – das crianças durante 24 horas por dia, durante semanas, meses, anos inteiros?
Aí, sim, precisamos examinar o mundo da imaginação e o mundo da imagem, o mundo escrito e o mundo não-escrito, o império do “príncipe eletrônico” e a leitura visual dos livros impressos, enfim examinar o Texto em Sala de Aula e a escrita de histórias de vida e do mundo da imaginação das crianças, dos adolescentes e dos jovens em salas de aula.
Aí, sim, ler Bakhtin é vida, é ato responsivo de todos e de todas. Com Bakhtin, Calvino, Eco, e todos e todas que escreveram e continuam escrevendo o mundo-real e ficcional na estética da literatura local, nacional e universal sem fronteiras de línguas, de linguagens, de ideologias, de religiões, de pensamento, de filosofia… então para que persistir com teorias estruturalistas, formalistas, abstracionistas nas salas universitárias?
Há estudos científicos psicológicos, psiquiátricos, psicanalíticos, biológicos à exaustão, e todos apontando e alertando sobre os efeitos atrofiadores dos cérebros humanos pelo excesso e uso descontrolado sem limites da maquinaria eletrônica pelas nossas crianças, nossos adolescentes, jovens, adultos, velhos…É urgente examinar os benefícios e os malefícios do império da maquinaria eletrônica.
O celular aproxima os distantes e distancia os próximos. É a sociedade dividida ao meio: o lado bom e o seu oposto lado dos malefícios. Aliás, é necessário ver as contradições em tudo. Estas fronteiras só são possíveis de examinar pelo método dialético.
Professor, pesquisador, escritor
José Kuiava é Doutor em Educação pela Faculdade de Educação da Unicamp (2012). Atualmente é professor efetivo- professor sênior da Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Planejamento e Avaliação Educacional, atuando principalmente nos seguintes temas: autobiografias.inventário da produção acadêmica., corporeidade. ética e estética, seriedade, linguagem, literatura e ciências e riso.
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