No golpe militar de 1964, foi também um General Mourão que saiu apressado do quartel, com tanques e soldados armados rumo ao Rio de Janeiro. Apressou os indecisos. Deu no que deu: assumiu Castelo Branco prometendo eleições diretas. Costa e Silva o sucedeu, foi deposto pelo golpe dentro do golpe, veio o famigerado AI-5 e o período mais duro da ditadura que não foi branda apesar da vontade da Folha de S. Paulo em retificar a história. Medici chegou com toda força da repressão. Seguiram-lhe Geisel e Figueiredo. A redemocratização veio com eleições indiretas…
Mais uma vez um General Mourão vem a público falando para precipitar acontecimentos. E segundo sua fala, dizendo o que pensa o Alto Comando das Forças Armadas! Apresentou-se pois como porta-voz. Ainda não li qualquer desmentido, alguma afirmação categórica tranquilizando a nação de que não é isso que pensa o Alto Comando! Terá havido? O Dr. Google não me levou a nada… Será por que não existe nada?
Nos cálculos de aproximações, parece que a intervenção se aproxima célere. O prazo que têm os poderes para continuarem poderes é curto. E no curto espaço de tempo, o que temos no horizonte não é de agradar a ninguém: um longo período de compra de votos no Congresso para liberar Michel Temer dos dois processos em andamento no Supremo. Portanto, Executivo e Legislativo estarão ocupadíssimos nos próximos 30 dias. Nenhum outro esforço será despendido, a não ser acelerar a venda do patrimônio público: o vendedor Michel Temer terá encontro com especuladores nos EEUU, organizado pela Financial Times, para ofertar a preço de banana a Petrobrás, o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, a Casa da Moeda… Sbrou algo? Ah, sim! A Amazônia.
Haverá tempo suficiente para editais, prazos, inscrições, propostas, etc para que a venda se realize? E mesmo que não se realize, nada sabemos quanto ao pensamento do Alto Comando. Será nacionalista, como o foi o militarismo de 1964-1985? Ou predomina a “modernidade do mercado” na formação dos oficiais brasileiros? Sobre isso nada nos adiantou o General Antônio Hamilton Martins Mourão.
Sabemos que o lema é debelar a crise impondo a ordem. A questão é: qual o limite da imposição da ordem? Uma ordem imposta, cerceando a liberdade e calando a vontade popular de se expressar pelo voto, somente ocorrerá se houver o emprego da força. Contra quem? Na ditadura passada, contra qualquer pensamento que não fosse aquele pregado pela “ordem”. Não esqueçamos: ame-o ou deixe-o não veio com a liberdade de definir o amor, o amor e os gestos do amor já estavam prescritos na Ordem do Dia que se espraiou para além dos muros dos quarteis. Amar significava aceitar o que os clarividentes, entre eles Delfim Neto, que ainda continua a arrotar clarividência na imprensa, prescreviam como solução para a crise.
Será que agora a clarividência viria da República de Curitiba, para a qual a lei pouco importa, importam as convicções? Ou nosso clarão virá de algum bispo neopentecostal, Malafaia, por exemplo, para reformar os costumes? Claro que não será nada disso. Gestam-se nos quarteis pensamentos muito mais avançados, muito mais dignos. Por enquanto, estes pensamentos encontraram poucos porta-vozes: Bolsonaro, o MBL e as Lojas Maçônicas. Como disse um dia Cazuza, o futuro é o passado, num museu de “grandes novidades”.
João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.
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