O escritor angolano nos brinda com mais um livro de literatura infantil. Numa história do menino Lino (seu nome somente aparece na epígrafe do livro, quando uma de suas frases é citada pelo autor).
O enredo na verdade desvenda um jogo entre luz/escuridão; entre ciência/comunicação e entre liberdade/prisão. Estes temas são tratados de forma quase direta ao longo do enredo.
Lino é um menino curioso que vive perto da Floresta Grande, onde “em noites de lua nova, quando o céu finge estar só vestido de nudez, brilham penduradas as estrelas, pequenas e belas.” O menino gosta de andar pela floresta, mas quando faz escuro, caminha com o avô. Numa destas caminhadas, o menino leva em sua mochila seus inventos: um aumentador de caminhos, uma montagem com três lentes: quando alguém chega ao fim do caminho, com o aumentador poderá continuar a caminhar; um monóculo (um binóculo com uma só lente, para o qual Lino recusa o nome ‘monóculo’) que serve para compreender o que dizem os pirilampos quando estão em seu pisca-pisca; e um convidador de pirilampos, uma pequena caixa com muitas cores estranhas.
O menino monta seus inventos, de modo que o aumentador de caminhos reflita a pouca luz que recebe no binóculo que a transfere para a caixa, e muitas cores aparecem no escuro da floresta. Os pirilampos curiosos foram ver as cores, entraram na caixa e nela ficaram presos. No dia seguinte, o menino buscou os pirilampos para colocá-los numa gaiola em seu quintal, de modo a poder observar os pirilampos e compreender o que diziam: aprender a sua língua. O que fazia? Cientistava os pirilampos. Há então uma conversa entre Lino e Edison, um pirilampo mais velho. Tudo conversado através de luzes que iluminam a escuridão.
No entanto, a partir de certo dia, os pirilampos não mais brilham. Ele pergunta a Edison a razão, e este explica que o que os faz brilhar são as histórias que os ‘pirivelhos’ contam. Sem histórias, perdem o brilho. Como o menino já havia cientistado os pirilampos, livra-os para irem ouvir as velhas histórias e voltarem a brilhar.
Eis um enredo tratado de forma poética (como em toda obra de Onjaki). E ao mesmo tempo com lições: as histórias que dão brilho à vida – elas carregam passados e sonhos. A cientistação de Lino para compreender a fala dos pirilampos e com eles se comunicar (e não para os descrever de forma distante e fria). A necessidade de liberdade para poder continuar a brilhar (a viver).
As ilustrações de António Jorge Gonçalves jogam o tempo todo com o claro/escuro, de modo que o leitor – a criança e o adulto – são envolvidos pelo jogo central desta obra: o claro, o conhecimento, a comunicação vs o escuro, o medo, o não saber.
Excelente livro. Irá para minhas netas. Elas não têm medo do escuro, mas aprenderão que os animais se comunicam e que merecem liberdade, mesmo quando a prisão que lhes decretamos seja para estudá-los. E mais: que estudar algo é aprender seus sentidos, o que implica uma atitude de comunicação com o outro, seja ele quem for.
Referência. Ondjaki. O convidador de pirilampos. Ilustrações de António Jorge Gonçalves. Lisboa : Editorial Caminho, 2017.
João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.
Também quero ler para minha neta.
Sempre lamento que não se vê mais vagalumes por aqui… há muitos anos.
Tem uma música linda, de tradição japonesa que você podia apresentar para suas netas.
É uma linda afiguração musical dos pisca-piscas dos vagalumes, pirilampos, para contar das lanternas japonesas…
E para encontrar no youtube,acabei encontrando o filme de animação completo e legendado “O túmulo dos” vagalumes” do Studio Ghibli (o mesmo de “A viagem de Chihiro” e “Ponyo”, que certamente você conhece). Acho que vc pode gostar. De quando os Estados Unidos queimam as cidades japonesas, antes de Hiroshima e Nagasaki. A história de um menino e sua irmã.
Se gostar, me conta.
Obrigada sempre,
Liana