Certamente hoje seria dia de comentar o debate da Band, ocorrido ontem à noite entre os presidenciáveis aceitos ou aceitáveis. Obviamente preferi o canal 247 para o debate alternativo e não devo ter perdido grande coisa. Dormi mais tranquilo porque não fui assustado pela cara de múmia de Meirelles nem pelos ataques de Bolsonaro.
Assim, vou escrever sobre “nossa insuportável perda salarial”. Mas não se alegrem. Não é a perda no salário mínimo, nem no salário minguado dos professores. Nada disso. Trata-se da insuportável perda salarial no judiciário. A casa da Madre Superiora reconheceu que não dá mais para viver com tão pouco, acrescido dos penduricalhos extras sem desconto de imposto de renda. A casa da D. Carmen, intolerante com a imoralidade, alheia à miséria que chegou ou ronda a todos, concedeu meros 16% de aumento no teto salarial, o que terá consequências em cascata.
Dá para entender. Com o protagonismo assumido, com a responsabilidade de criar leis segundo o momento, de agir fora da lei existente – mas de boa intenção, talvez cometendo um equívoco como se justificou o Dr. Angélico Moro – eles merecem um pouco mais. Afinal, a média salarial nacional de um juiz é salário de fome, meros 40 mil. Claro, com as honrosas exceções que chegam a 100, 120, 170 mil mensais, uma mixaria. Era preciso compensar o excesso de trabalho. Não é fácil dar roupagem juridês aos ódios semeados e alimentados diariamente pela mídia tradicional.
Vejam por exemplo o frustrado acordo que deveria ter sido concretizado ontem pelo plenário da Casa, sepultando ‘veleidades’ eleitorais do Lula. Como se sabe, juízes, incluindo ministros da Casa Legislativa de D. Carmen, devem se pronunciar sobre o requerido pelas partes com base em provas e na legislação vigente. Mas quando o judiciário assume poderes legislativos, decretando um juiz individual ou um colegiado, o que deve ser a lei, tanto substantiva quanto processual, e modificando o que valia até então como lei, e fazendo isso a cada circunstância (vejam-se as concessões e as negativas para habeas corpus para os apadrinhados ou perseguidos, respectivamente), fica-se ao léu porque não se sabe o que virá. Dependerá da vontade externa à Casa.
Esta externalidade (gostou D. Rosa?) vem do ódio destilado pela Rede Globo. E ele impera no meio jurídico, por maioria colegial. Assim, cabe aos colegiais se pronunciarem num invólucro de juridês segundo o script que lhes foi encomendado. Isto dá trabalho, muito trabalho. Era preciso pagar melhor este sobre trabalho.
Ao arrepio do direito processual, Fachin e D. Carmen, esta emagrecida pelo veneno do ódio – deus nos acuda, se a tecnologia chegar aos spas de emagrecimento – armaram no juridês uma declaração extemporânea sobre a inelegibilidade de Lula. À defesa restou somente a desistência da ação, para evitar o golpe dos atores da Rede Globo e da mídia. E por enquanto nada ficou garantido para a mídia que terá de continuar batendo na mesma tecla. Fachin teve que arquivar o pedido, levando Fux e Barroso ao paroxismo por não terem a oportunidade de extravasar o ódio que os move.
Elaborar em tom jurídico todas as necessidades políticas do golpe; receber pedidos, trabalhar neles para sempre indeferir quando se trata de adversário e conceder quando se trata de correligionário; depois disso tudo ainda ter que se dar ao trabalho de mandar arquivar perdendo tanto esforço, tanto suor, tanta elaboração intelectual e fazer isso tudo por um salário miserável! Insuportável!
E nós nos concedemos 16% de aumento.
João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.
Muito bom! Acho pouco o aumento. Eles merecem mais! Afinal, achar tanto “juridês” pra tanto golpe… não é trabalho fácil, ainda mais agora com as cortes internacionais querendo meter o bedelho no Brasil!
Vcs não acham q mereciam mais? A Globo podia complementar o salário, afinal, cada telejornal tem um ou dois ajudando a fazer o golpe ter credibilidade!!!
( bom, talvez isso seja parte dos penduricalhos q não são parte da folha; aquilo q antes se chamava “caixa 2”. Devem ter achado um nome mais bonito e “adequado” no “juridês”!!!! Kkkk