Como chegamos aos tempos em que teremos necessidades prementes de catarse, nada melhor do que voltar a velhos livros com as charges políticas dos fins da ditadura militar, como é este livro de Chico Caruso.
Na introdução, em palavras para um artista que se revela e fala pelo desenho, conta-nos o chargista como chegou ao Jornal do Brasil para cobrir as férias de Ziraldo, em setembro de 1978.
A caricatura é de Figueiredo, então o general do SNI e posteriormente ungido para assumir a Presidência. Ela foi publicada na revista ISTOÉ (atualmente conhecida como ISTOFOI).
A caricatura de Chico nos mostra um militar condecorado, com busto e braços enormes, e uma cabecinha desproporcionalmente pequena, com os eternos óculos escuros que o general usou sempre.
Publicado na ISTOÉ em setembro de 1978
Nesta introdução, Chico não só nos narra um pouco do contexto e do meio jornalístico em que produzia suas charges, suas caricaturas políticas, mas também dos tempos em que estas, por políticas, foram substituídas por “ilustrações” dos textos publicados, no auge da ditadura que foi o período de Garrastazu Medici.
As caricaturas e charges escolhidas pelo autor para este seu livro cobrem a produção de um período bastante longo, mas o foco central da seleção é do período do governo Figueiredo – e a maioria delas é do próprio general-presidente, o último da série.
Publicada no Jornal do Brasil, em 07.09.1982
Mas não faltam charges com os ministros do presidente, e claro que Delfim Neto terá lugar destacado, como na charge em que se critica o aumento do preço da gasolina, que poderia ser tão atual, simplesmente substituindo Delfim por Parente e atualizando ainda mais, por Paulo Guedes, que é um pau difícil de aguentar:
Publicada no Jornal do Brasil em 04.12.1980
Lendo agora o livro do Chico Caruso, a gente recorda as hesitações do regime militar quando se discutia a sucessão de Figueiredo. E supostos dramas de consciência deste para apoiar o candidato do Golbery: Paulo Maluf.
Publicada em O Globo de 09.06.1984
Tudo apontava para um candidato “civil” mas que mantivesse o leme na direção apontada desde o começo da “redemocratização moderada” de Geisel…
Eram os tempos da luta pelas diretas. DIRETAS-JÁ reuniam milhares de pessoas nas manifestações do Rio de Janeiro e de São Paulo, espalhando-se Brasil afora. Enquanto nas ruas e praças o grito era pelo voto direto, nos palácios se tramava a eleição indireta de algum nome “confiável” e foram aparecendo outros nomes, para além do candidato Maluf:
Publicada em O Globo de 08.07.1984
Tentaram até ressuscitar Magalhães Pinto, que se tornara nosso Chanceler
Publicada no Jornal do Brasil em 01.11.1981
Como a história registra e como sabemos todos, não houve eleições diretas
Publicada em O Globo em 18.03.1984
Mas o Colégio Eleitoral elege a chapa oposicionista: Tancredo/Sarney. Tancredo vai para o hospital, e Sarney governa o Brasil a partir de 1985, convoca uma Constituinte e sai do governo já imortal na Academia Brasileira de Letras.
Publicada na ISTOÉ em julho de 1984
Publicada em O Globo em 12.06.1984
Referência: Chico Caruso. “Não tenho palavras”. São Paulo : Circo Editorial, 1984.
João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.
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