Menino de rua, de Patativa do Assaré

Menino de rua, garoto indigente,

Infanto carente,

Não sabe onde vai

Menino de rua, assim maltrapilho

De quem tu és filho

Onde anda o teu pai?

 

Tu vagas incerto não achas abrigo

Exposto ao perigo

De uma drama de horror

É sobre a sarjeta que dormes teu sono

No grande abandono

Não tens protetor

 

Meu deus! que tristeza! que vida esta tua

Menino de rua,

Tu andas em vão

Ninguém te conhece, nem sabe o teu nome

Com frio e com fome

Sem roupa e sem pão

Ao léu do desprezo dormes ao relento

O teu sofrimento

Não posso julgar,

Ninguém te auxilia, ninguém te consola,

Cadê tua escola,

Teus pais e teu lar

Seguindo constante teu duro caminho

Tu vives sozinho

Não és de ninguém

Às vezes pensando na vida que levas

Te ocultas nas trevas

Com medo de alguém

Assim continuas de noite e de dia

Não tens alegria

Não cantas nem ri

No caos da incerteza que o seu mundo encerra

Os grandes da terra

Não zelam por ti

Teus olhos demonstram a dor, a tristeza,

Miséria, pobreza

E cruéis privações

E enquanto estas dores tu vives pensando,

Vão ricos roubando

Milhões e milhões

Garoto eu desejo que em vez deste inferno

Tu tenhas caderno

Também professor

Menino de Rua de ti não me esqueço

E aqui te ofereço

Meu cantar de dor

(Patativa do Assaré. Aqui tem coisa. S. Paulo : Hedra, 2004)

 

João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.