Haddad no Banco BTG-Pactual

 

Ainda que dois veículos do golpe tenham noticiado que o desembargador João Gebran Neto, do TRF-4, tenha confessado que agiu de forma ilegal “para evitar dano maior” (claro que o dano maior é definido por ele próprio, de modo subjetivo, sem amparo legal ), todos sabemos que esta “confissão” vazada por amigos e aliada às denúncias do delegado geral da PF, Rogério Galloro sobre os abusos de autoridade de juiz, desembargador e procuradoria geral  jamais serão investigadas. O mais provável é que o delegado Rogério Galloro venha a pagar alto custo por sua entrevista ao Estadão; e que Gebran caia no ostracismo por algum tempo. Afinal, sabemos todos que o judiciário não se guia por leis, mas pela soberba e pela empáfia.

A pergunta fundamental destes episódios, para mim, tem a ver com esta repentina “união” de três veículos de informação golpistas dando notícias que deveriam ser abafadas, deveriam ser escondidas, deveriam ser deixadas de lado até há poucos dias! Todos sabemos: não é mudança de linha editorial nem vontade de fazer jornalismo a sério. Trata-se de medo das urnas! Nada mais do que isso.

Afinal, Haddad na “sabatina” a que o submeteu Reinaldo Azevedo no Banco BTG-Pactual levantou explicitamente a questão da regulamentação dos meios de comunicação social, e o fez a partir de uma pergunta em que o jornalista ironizou fala de Dilma Roussef de que não esqueceria jamais o que fez a imprensa com seu governo e no seu impeachment. Vale a pena conferir o que disse Haddad:

O que nós estamos falando sobre meios de comunicação? Uma coisa mais ou menos óbvia. As pessoas às vezes não se dão conta do país que a gente vive. A ANJ – é a Associação Nacional dos Jornais – entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, ministro Jobim, no Supremo Tribunal Federal invocando o Artigo 222 da Constituição contra os sites mantidos por agências estrangeiras, como o El País Brasil, BBC Brasil, The Intercept Brasil, pra ou sair do ar ou vender 70% do capital pra brasileiros natos. É dessa imprensa que nós estamos falando. De uma imprensa que acusa todo mundo que quer cumprir a Constituição de ser um possível sensor, mas que é a primeira a tomar medidas judiciais pra acabar com a concorrência. Uma concorrência, na minha opinião, muito bem-vinda. Ou alguém acha que o El País transforma o Brasil numa Venezuela? É disso que nós estamos falando? A BBC coloca em risco a segurança nacional? Eles invocaram inclusive a segurança nacional pra pedir isso. E ainda falam na ação, curiosamente, em alinhamento do pensamento. Gente, não podia ser mais explícito! Nós estamos vivendo uma situação de hipocrisia. Se você pegar qualquer estado, os mais conhecidos todo mundo sabe de cor: Maranhão, Alagoas, Bahia… Mas poderíamos ir o país inteiro. Uma família controla TV, rádio e o principal jornal… (intervenção de Reinaldo Azevedo inaudível) Aliado da Rede Globo, aliado do PT, aliado de todo mundo… Não estamos aqui discutindo isso. Mas é uma família que controla, naquele território, todos os meios de comunicação mais importantes. Isso é proibido em qualquer país civilizado. Isso é proibido nos EUA, na Inglaterra, na França… São esses os paradigmas que nós estamos utilizando. Qual é o problema? Qual é o problema da família ACM ter que vender uma rádio? Fica com o jornal e com a TV. Ou ter que vender o jornal? Qual é o problema? Qual é o dispositivo constitucional que está sendo violado? Qual o princípio que está sendo repudiado do liberalismo, da socialdemocracia, do que quer que seja? Estamos falando de coisas concretas. Qual é o problema de apoiar formas alternativas de organização da comunicação? Nós podemos fomentar mais rádios comunitárias, mais cooperativas de jornalistas… Qual é o problema? Quem tem medo da pluralidade? Quem tem medo da diversidade? Por quê?

A imprensa golpista sabe: terá que conviver com a discussão da regulamentação, porque todos sabem: Lula ou Fernando Haddad, um deles será o próximo presidente da república e terá na sua caneta a sobrevivência desta imprensa que mama nas verbas do governo e não sobrevive sem elas. Mas não temem somente o estrangulamento financeiro: temem a perda do poder por uma necessária regulamentação prevista na Constituição de 1988 e até hoje não realizada.

João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.