Uma imagem. Vivemos uma civilização da imagem. Do jeito que o mundo TeVe. Mundo refratado na infinitude de imagens. Fragmentos de imagens da política em frangalhos.
Enquanto o presidente eleito, logo após os resultados de segundo turno, muito soberbo e orgulhoso, ia escolhendo, convidando e definindo os seus primeiros e mais poderosos e autoritários aliados no poder – composição e constituição do comitê executivo, rigorosamente e autenticamente de acordo com os interesses dos blocos dominantes do capital nacional e do capital estrangeiro, com ordens e rezas de pastores do bloco evangélico – nas horas vagas de folga, o eleito ia até o alfaiate para tirar medida do terno (fatiota, no linguajar do gaúcho) para a sessão solene de posse de presidente do Brasil. Ia, também, ao cabeleireiro para cortar e ajeitar o topete de fios esticadinhos, retinhos, alisados da frente para trás e para os lados, bem à moda e estilo de militar superior reformado. Andava indisciplinadamente orgulhoso à vontade, sem pudor, vestido de militar em dias de folga: camiseta amarela popular sem grife por fora da bermuda branca e de chinelos nos pés. Numa postura muito perseverante aos seus rebaixados propósitos, queria impressionar e conquistar a adesão dos aliados (e das multidões de alienados) pela simplicidade no pentear, no vestir e no andar. Se a simplicidade é autêntica ou não, isso não vem ao caso. O presidente eleito, fiel à disciplina hierárquica quartelesca, permanece sempre serio de rosto sisudo em posição de ataque e defesa. O presidente eleito não é ridente. Continua fiel à disciplina da ordem e obediência. E não faz rir. Aliás, um momento: só ri – sorri – para as câmeras e faz rir só pelos enunciados disparatados e ridículos de assuntos que não conhece e não entende minimamente. Primeiro fala e diz. Depois desdiz. Sem passar vergonha.
Dias depois, o presidente eleito aparecia diante das câmeras de camisa social creme e manga comprida. Um pouco mais jovem, de aparência.
Já nos últimos dias, o presidente eleito aparece em postura mais elegante e formal, vestido de terno e gravata, anunciando nomes de seus ministros, autenticamente aliados e fiéis às propostas de programa de governo de um autêntico desentendido. Fala de economia sem bases conceituais, estruturais, sociais, científicas…; fala de educação sem educação. Convida um professor de sangue não brasileiro, um encefaloide para ocupar o ministério da educação. Este cidadão geneticamente não brasileiro vai instituir e implantar uma educação alienada ao capital e alienante das brasileiras e dos brasileiros pobres; uma educação fetichizada e fantasmagorizada de neutralidade ideológica pura e imaculada; acima de tudo e acima de todos, vai implantar “a escola sem partidos”, por ordem do quartel e de bispos e pastores evangélicos. Estes, os pastores, entendem tudo tim-tim por tim-tim de arrecadação de dinheiro dos seus fiéis. Sempre em nome do Senhor. E agora, os pastores impõe o ministro da educação.
Ora, senhor presidente eleito e senhor ministro da educação, quem proclama, prega e impõe a neutralidade ideológica confirma o seu lugar na escala da direita mais alta escrotal e conservadora da sociedade de classes sociais. Isso é perversamente ideológico. Os senhores, presidente eleito e ministros, precisam saber com urgência que ainda não existiu ao longo da história dos homens – e continua não existindo e não irá existir – uma sociedade democrática sem partidos políticos. Os partidos políticos são o cérebro e o sangue da sociedade democrática. E quando contaminados, infestados por germes, corrompidos por células cancerígenas, precisam ser higienizados e medicados com procedimentos científicos precisos e eficazes. E acima de tudo, com uma educação de formação humana.
Lembrem-se, numa sociedade democrática contemporânea, desde uma democracia do seu nível mais baixo e elementar até o seu nível mais elevado e substantivo, os partidos políticos são o elemento vital imprescindível, sem os quais não há e não haverá uma sociedade democrática. Quer dizer, não haverá uma sociedade democrática sem um governo democrático. Na ciência política, nada mais verdadeiro e ético do que o dito e escrito de Antônio Gramsci sobre o partido político: o “Príncipe Moderno”.
Assim, senhor presidente eleito e seus preclaros ministros, a escola é o espaço social pedagógico mais importante e rico para as vidas e as existências dos alunos, desde quando criancinhas, adolescentes, jovens e adultos. A escola é o espaço, o lugar, o tempo mais apropriados e preparados cientificamente para formação dos sujeitos, das pessoas, dos cidadãos na infinitude de suas relações, na alteridade, na amorosidade, no diálogo, na liberdade, com seus sentimentos e inteligências irrigados pela imaginação.
E por fim, senhores, um pedido sincero e autêntico: por gentileza e pela energia dos mais elevados princípios da ética, da liberdade, da justiça, da solidariedade, não queiram implantar e impor o velho e desastroso princípio pedagógico do “vigiar e punir”. Está mais que provado e comprovado que quanto mais mecanismos – forças armadas, armas, instrumentos materiais e eletrônicos da mais elevada tecnologia, policiais, guardas, vigias, fóruns da justiça superequipados, câmeras nas escolas, nas ruas, nos bancos, etc. etc. – mais criminosos e crimes horríveis acontecem e irão acontecer.
No lugar do princípio pedagógico do “vigiar e punir” precisamos fundar, instituir e vivenciar o princípio pedagógico da “autoresponsabilidade”, a formação da “autoconsciência” desde o berço das crianças até o último instante de vida dos idosos. O cérebro de cada uma e de cada um, de todas e de todos, é a câmera, a luz, a consciência, a inteligência na formação da autoconsciência individual e coletiva.
Ah! por gentileza, não digam que isso não é possível.
Sim, senhor presidente eleito, ministro da justiça, ministro da educação, ministro astronauta da ciência e tecnologia, por gentileza, por autêntica gentileza, não queiram impedir uma educação livre, multíplice, visível, consistente e consciente, uma educação critica de elevada qualidade para todas as crianças, todos os adolescentes e jovens do nosso – de todos – querido e amado Brasil.
Professor, pesquisador, escritor
José Kuiava é Doutor em Educação pela Faculdade de Educação da Unicamp (2012). Atualmente é professor efetivo- professor sênior da Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Planejamento e Avaliação Educacional, atuando principalmente nos seguintes temas: autobiografias.inventário da produção acadêmica., corporeidade. ética e estética, seriedade, linguagem, literatura e ciências e riso.
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