É o que o povo quer?

Olhando o mapa da votação, não dá para esconder o sol com a peneira. É o que o povo quer, sim. O povo alemão também quis. O povo alemão fez de conta que não sabia de nada. O povo alemão tem vergonha de sua história. O povo alemão somente voltou a olhar para sua bandeira na Copa do Mundo. O povo alemão perdeu a vida, e somente a recuperou porque o capitalismo tinha que ter uma boa vitrine diante da vitória da Rússia, que esmagou Hitler.

Daqui a alguns anos, terão nossos netos um “plano Marshall”? Somente se houver nova guerra fria, agora entre o agonizante EEUU e a emergente China. Nossa geração não verá.

Podem me dizer: “Haverá segundo turno! A luta continua!” E daí? Os dados foram lançados no primeiro turno: destilar ódio é mais produtivo eleitoralmente quando a miséria bate à porta! Como Hitler, somente foi necessário construir um inimigo. Naquele tempo eram os judeus, os comunistas e os homossexuais. Aqui, nos trópicos, o braço longo do Departamento de Estado, em resposta aos interesses econômicos das petrolíferas e das empreiteiras norte-americanas armou um juiz do interior que submeteu todo o judiciário a seu bel prazer, criou através da mídia tradicional uma cavalgada (porque não se trata de cruzada, se trata de cavalgada) moralista contra a corrupções e o resto ficou por conta dos falsários de sempre, agora autores de Fake News e as academias forneceram os corpos bem torneados de nossos jovens da SS. E para não esquecer: como a fonte das Fake News é a elite escolarizada, a universidade com seu cientificismo e neutralidade colocou a pá de cal necessária ao fascismo nacional.

Seria melhor termos um governo fascista eleito sem qualquer dúvida, direto, assim, pela vontade das urnas, manipuladas ou não? Foi tanto ministro dizendo que confiava nas urnas eletrônicas que passei a desconfiar delas pela primeira vez. Aquela reunião presidida pela colegialada D. Rosa Weber foi mais do que ridícula: balbuciava números dentro dos quais se perdia: prestava contas do serviço feito.

Todo mundo sabe que os militares já estão no poder: quem manda no chamado Executivo é o Gen. Sérgio Westphalen Etchegoyen; quem manda no STF é o Gen. Rocha Paiva. No parlamento? E que parlamento temos nós! E que parlamento elegemos ontem!

E como haverá segundo turno, me desculpem os que ainda não entenderam os recados de autogolpe, de vitórias por aproximações do Gen. Mourão: se eles perceberem que o Haddad  possa vencer, enfiarão goela abaixo tanto voto como fez neste primeiro turno.  E a força trará a forca.

Assim, que os otimistas me perdoem. Teremos um fascismo à brasileira. Historicamente, muitos países tiveram que chafurdar para se levantar: França, Espanha, Portugal, Itália, Alemanha (a que mais chafurdou e matou!). É a nossa vez. E novamente faremos como temos feito, como fizeram os alemães: não saberemos de nada, como fazemos de conta hoje: ‘não sabemos’ que o povo negro, o povo pobre, a comunidade LGTB, todos, estão acostumados às cacetadas da tortura policial.

Por meu turno, matriculo-me amanhã mesmo num curso de formação de pastores evangélicos. Pretendo fazer sermões com uma bíblia numa mão e a outra no bolso dos crentes. E hei de vencer e virar bispo da igreja universal. Aí tomarei os melhores vinhos do mundo rindo da cara dos que me sustentarão com o melhor que houver.  O resto? O resto era bobagem minha juventude vetusta aos 72 anos! Mas até um burro de carga aprende o caminho. Aprendo o meu a partir de amanhã de manhã, no meu novo curso!

Ah! Também posso oPTar por um curso por correspondência para ler cartas. Então passarei a ler cartas, tirar a sorte e lhes dizer seu futuro. Cobrarei, evidentemente… Atenderei das 10,00 às 14,00, através da internet! Poucas horas por dia, que ninguém é de ferro, mas precisarei do dinheiro para ajudar a pagar o pato amarelo…

Oh! Satan que me dê paciência! Que Mefisto me apareça noite adentro… fecho acordo na hora!

 

 

João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.