Tristes novas, novas tristes, chegaram agora de
Granada,
D. João estava doente com penas da sua amada.
– Tu que tens, ó filho meu, ó filho da minha alma?
– Eu só estou aqui deitado, mas a mim não me dói nada.
– Se deves algum honra a alguma menina honrada,
Paga-la com dinheiro que o dinheiro todo paga.
– Devo-le a D. Isabel que la deixo desgraçada,
já le dei cem cruzados, só por ver se ela casava.
– Com cem cruzados, meu filho, uma honra não se paga.
– Já le deixo mais duzentos para aquela desgraçada.
Donde vens, D. Isabel [……………..]
descalcinha e em cabelo, com a cor tão demudada?
– Venho de pedir a Deus e à Virgem Santa sagrada,
que te ergas dessa cama, perdição da minha alma.
– Se eu desta cama me erguesse, a tua flor a vingava,
levava-te p’r’à Igreja fazer-te mulher honrada.
Adeus, minha pomba branca, tão vestida e tão perfeita,
que me vou p’r’à eternidade, sem te dar a mão direita.
(Versão de Ifanes (Concelho de Miranda Doutro,
distrito de Bragança. Recolhida por Orlando Ribeiro em 1936)
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Lá das bandas de Castela, triste nova era
chegada:
Dom João que vem doente, mal pesar de sua
amada!
São chamados três doutores dos que têm mais
nomeada:
que se algum lhe desse vida, teria paga
avultada.
Chegaram os dois mais novos, dizem que não
era nada;
por fim que chega o mais velho, diz com voz
desenganada:
– Tendes três horas de vida, e uma está
meia passada;
essa é para o testamento, deixar a alma
encomendada,
a outra é para os sacramentos, que ‘inda é
mais bem impregada;
Estando nestas conversas, Dona Isabel que é
chegada.
Ergueu os olhos para ela com a vista já
turvada:
– Ainda bem que vieste, minha prenda
desejada,
que tanto queria ver-te nesta nesta hora
minguada!
– Tenho fé na Virgem santa, nela venho
confiada,
que me há-de ouvir e salvar-te, que o tem
mal não será nada.
– Oh! que se eu chegar a erguer-me, minha
rosa namorada,
no vaso deste meu peito p’ra sempre serás
plantada,
co’as bênçãos de um arcebispo e de água
benta regada,
co’a estola da santa igreja ao meu coração
atada.
Estando nestas conversas, suamãe que era
chegada.
– Que tens tu, filho querido, desta alma
amargurada?
– Tenho, mãe, que estou morrendo, que esta
vida está acabada;
com só três horas de minhas, e uma já meio
passada.
= Filho de minhas entranhas, nesta hora
minguada,
lembra-te se algo deves a alguma dama
honrada.
– Minha mãe, que devo, devo… e Deus me
não peça nada!
Dona isabel que em má hora por mim fica
difamada.
Mas deixo-lhe mil cruzados para que seja
casada.
– A honra não se paga, filho; mil cruzados
não é nada.
– Já lhe deixo mais duzentos e a cruz de
minha espada,
e a vós, minha mãe, vos peço que a tenhais bem
guardada.
O que com ela casar tem uma vila ganhada;
o que lhe disser que não tenha a cabeça
cortada.
– A honra não se paga, filho, nem com
terras é comprada.
Se a essa dama lhe queres, não deixes
desonrada!
– Pois fique esta mão já fria na sua mão
adorada:
de D. João é viúva, condessa será chamada.
(versão fictícia, Editada por Almeida
Garret, Romanceiro III. Lisboa :
Imprensa Nacional, 1851)
(Referência: Pere Ferré. Romanceiro português da tradição oral
moderna. Versões publicadas entre 1828 e 1960. Vol. I Lisboa : Fundação Calouste
Gulbenkian, 2000)
João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.
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