Creio, logo existo
Ergo a mão e ponho pontos no espaço
traço e fio a realidade que crio
ergo sum assim ungido
O mito se volta e vira
estátua de sal
só a crença é real
A verdade é onde não está
Mentira é o que não vivi
murmúrio do credo
que não aprendi
A crença é matemática:
serpente que em si mesma se enleia
e come a própria cauda
prova dos nove, tautologia
vício em círculo
alfabeto em que é escrito o universo
B é igual a C que é igual a A que é igual a B
ou o reverso
perante deus, todos iguais,
no inferno, no céu, ou talvez
purgatório
O homem existe proque crê
ou por ter criado a matemática
dá no mesmo
Deus faz conta e o homem conta com deus
todo resultado é válido
o mais é classificação: F ou V
Só o sonho é uma heresia.
“E pôs um novo cântico na minha boca”
(Salmo 40:3)
O criador cria o demônio
os templos o pluralizam
Demônios não me infernizam
são-me alheios
carrego apenas um cântico
que pluralizo
sempre em novas harmonias
de improviso
Criatura,
só crio o que me foi dado
e aceito
como o cântico em que creio
posto na minha boca
singular
único
sem demônios
(Luís Alberto C. Bellissimo. Concerto para cordas cósmicas, 2017)
João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.
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