Domingo: Canção dos caramujos, Jacques Prévert

Canção dos caramujos que vão ao enterro

Ao enterro de uma folha seca

Vão dois caramujos

Têm a concha negra

E véu negro em volta das antenas

Vão pela noite

Uma bela noite de outono

Quando chegam coitados!

Já chegou a primavera

E as folhas que jaziam pelo chão

Todas tinham ressuscitado

os dois caramujos

Ficam muito desapontados

Mas eis o sol

O sol que lhes diz

Façam o favor façam

O favor de sentar 

Tomem um copo de cerveja

Se vontade lhes dá

Tomem caso queiram

O ônibus para Paris

parte esta noite

Poderão admirar a paisagem

Mas não ponham luto

Sou eu quem lhes aconselha

Escurece o branco do olho

E também enfeia

Histórias de enterro

São tristes e nada belas

Ganhem as suas cores

As cores da vida

Então animais

Árvores plantas todos

Começaram a cantar

A cantar aos berros

A verdadeira canção viva

A canção do verão

E todo o mundo a saudar

É uma bela noite

Uma bela noite de verão

E os dois caramujos

Voltam muito comovidos

Muito felizes

Como beberam demais

Ziguezagueiam um pouco

Mas no céu lá no alto

A lua protetora. 

(Jacques Prévert. Poemas. Seleção de tradução de Silviano Santiago, Ed. Nova Fronteira)

 

 

 

 

João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.