por João Wanderley Geraldi | jan 6, 2019 | Blog
LV
Exilado na indecisão em que coexistem
o carro e o sinal e o pedestre
e a minha própria existência
(da qual não posso sair
como o caroço não sai da fruta
que ainda não foi destroçada
ou como a gema não sai do ovo
que em forma ovoide perdura).
LVI
Exilado a raspar as unhas no pó desta parede
caiada como o túmulo
das aves coloridas que eu perdi
sob o relâmpago
que destruiu a minha consequência mais bela
(a quem indagar? e o que combater?)
A não ser esta sombra
do meu rosto
sobre a face do outro
ou no torto
esqueleto da cidade a balançar-se
enforcada
no laço mais soturno de minhas veias
sob os ciprestes nos portais do nada.
Exilado nos desfechamentos do acaso
sempre idêntico a si mesmo
em seu porte maior quando derruba
nos abismos sem mapa o que é desígnio
ou o filosofar inútil, o vão palavreado
da boca que sistematiza porque teme
a orfandade da vida neste Cosmos.
LVII
Exilado de você, de mim, de todos e de tudo
ao som deste violino neste rádio
neste quarto, nesta cidade, neste mundo
em que apanho meu cérebro entre as mãos
e o contemplo,
coisa a ser espatifada
para que afinal haja silêncio, paz
entre as coisas que amo, as alegrias
da vida que por muito amor criei.
E porque este piano escava
ao lado do fagote esses tambores
na vida perdida para sempre, aquela vida
em que fiquei exilado como a planta
a carecer de sol no canto
da sala
inteiramente vencida pela sombra?
LVIII
Exilado no sofá, que é de fato uma cadeira elétrica executando
noite após noite
cada autenticidade minha foragida.
Exilado na mão prenunciando a pólvora, cujas marcas
desde já desenho na imobilidade dos meus dedos
Exilado no amigo, a exigir-me preestabelecido em sua ternura conveniente e fácil.
Exilado nos tapetes, a se enrolarem nos pés do meu silêncio,
como cobras me domando em frases de almanaque.
Exilado na mulher que me acompanha, por ter-lhe dado
em troca de tanto amor o meu incêndio
sobre os trigais a que me convidara
Exilado no amor pelos meus filhos, por sentir-me escuro
a transportar a claridade
por mim rezada para o tempo deles.
Exilado na casa onde resido, pois não sei mais como mantê-la
tal como eu gostaria mas não posso
por causa desta chama em que me acabo
sem outro saber que o deste verso.
Exilado e só, às vezes tão incrivelmente só
que o meu retrato de vidro nos espelhos
era a única realidade
a que eu me agarrava
para sentir que eu existia e que nem tudo
era o sonho de um sonho se sonhando
dia a dia
neste calor de imagens minhas
a desfilar vazias sobre o nada
da minha morte que em mim me precedia
[…]
LXIII
Exilado no exílio de todos os exílios
que em mim não findam mais
e são eternos
porque neles morrerei e para sempre
no meu tempo morto eles serão
– imutáveis –
os exílios que sempre foram
dentro de mim, quando eu vivia
como a flor que ao ser regada pela sombra lembra
as exigências de sol sobre o seu caule
– e em direção da aurora se prolonga.
(Moacir Félix. Canção do Exílio Aqui. RJ : Civ. Brasileira, 1977)
por João Wanderley Geraldi | jan 5, 2019 | Blog
Da série livros para ler e ver I
Este livro resulta de uma longa conversação entre Le Goff e Jean Lebrun, que introduz na forma de perguntas ou curtos comentários os temas sobre as cidades da Idade Média e aquelas do mundo contemporâneo. A tese defendida pelo historiador é que nossas cidades de hoje estão muito mais próximas das cidades medievais do que estas estavam das cidades da Antiguidade.
A aproximação entre ambas se dará mais especificamente nas funções que exercem as cidades e no surgimento de uma gama variada de relações políticas. Se no campo a relação se dava entre o senhor, nobre e proprietário de terras, e os camponeses, sem qualquer outra intermediação, as cidades fazem surgir profissionais que tornam as relações muito mais complexas. Para o historiador, a divisão tripartite entre as produções primária (agricultura e pecuária), secundária (indústria) e terciária (serviços), esquece um conjunto bastante significativo de uma produção artesanal de pedreiros, carpinteiros, marceneiros, ourives, pintores etc. cujo trabalho se realiza, normalmente sob encomenda com produtos artesanais e únicos.
Não se trata de uma prestação de serviços, mas de uma produção de transformação sem ser em série como ocorrerá na indústria. Há, obviamente, prestação de serviços (estalagens, ensino – não só escolar, etc). E na cidade circula dinheiro, enquanto no campo permanecem as trocas diretas de produtos. Como existem inúmeras moedas, há necessidade de câmbio: surgem as bancas (donde vem “banqueiro”) normalmente pertencentes a judeus que passam também a fazer empréstimos sob penhora. Coube aos judeus esta função porque o exercício de outras profissões – exceto o da medicina – lhes foram pouco a pouco interditadas. Obviamente, é também nas cidades que sobrevivem os pobres, os fugitivos, os procurados nelas se escondem.
Mas será o conjunto de profissionais que na cidade medieval vai provocar novas relações de poder: as associações dos profissionais e o enriquecimento de alguns levarão a uma partilha do exercício do poder citadino, quando não a um “governo civil” responsável pelo executivo, com esvaziamento do poder do príncipe que se torna às vezes um poder moderador ou da distribuição da justiça.
Assim, as cidades tornam-se a sede do poder político: o príncipe nela constrói seus castelos e palácios (ainda que nem sempre viva na cidade o tempo todo), elas se tornam as sedes dos bispados com suas igrejas monumentais e os palácios episcopais; os burgueses enriquecidos erguem também seus palacetes.
Surgem os “centros” onde em geral estão as praças – que não é mais o fórum da cidade antiga mas um lugar de lazer, de manifestações culturais, de manifestações políticas. Como as cidades são muradas – uma das grandes funções da cidade é a segurança, dentro dela seus habitantes se sentiam mais seguros do que no campo onde viviam isolados – os espaços são muito valorizados, os preços dos terrenos do centro são altos. Assim começam a surgir: o centro valorizado; o seu entorno na forma de bairros, muitas vezes com suas próprias praças em frente a Igrejas e conventos; os subúrbios mais próximos aos muros onde residem os pobres. Só muito mais tarde, para fora dos muros, começa a aparecer uma “periferia” inicialmente com construções encostadas aos muros.
A cidade medieval é também o lugar das feiras. Embora possam acontecer na praça central, em geral as grandes feiras se realizam fora dos muros da cidade: uma feira é mais do que um mercado, nela se reúnem artistas, mambembes, cartomantes, lutadores… Mas só aparentemente as feiras recuperam o “fórum”: enquanto as feiras têm um caráter de acontecimento, o antigo fórum é permanente.
Desaparecem também as termas públicas, mas isso não significa que a cidade medieval era uma imundície. Pelo contrário, hábitos de higiene passam a ser cultivados e há mesmo cuidados que hoje chamaríamos de sanitários.
Para o historiador, duas instituições serão fundamentais na configuração da cidade: as ordens mendicantes que pregam na cidade e que nela constroem seus conventos (que muito frequentemente têm o poder de deslocar o centro ou criar um novo centro) e as universidades que atrairão para as cidades professores e estudantes, uma classe turbulenta de jovens em geral com boa renda, que farão avançar costumes e a cultura. Eles são financiados pelos pais, normalmente nobres do campo. Transcrevo aqui uma passagem de uma carta de um estudante seu pai:
Meu querido papai, a vida que levo aqui é muito instrutiva, mas eu não tenho mais um centavo, seria ótimo se você provasse que ainda me ama.
E mais surpreendente é o texto de propaganda quando da criação a universidade de Toulouse em 1229 a pedido do Papado para “combater a heresia depois da cruzada dos albigenses”. Ele foi redigido pelo célebre mestre universitário John Garlande que elogia a cidade, sua água, seu ar… e
…acrescenta coisas inesperadas num texto de um universitário do início do século XIII: as toulousianas seriam mulheres formosas, dando mesmo a entender que algumas delas não são demasiadamente ariscas.
Mas é no nível do comportamento das pessoas que distinguirá o citadino do camponês. É na cidade (civitas) que surgirá a civilidade, a polidez, o cavalheirismo. E também uma estética própria: enquanto a orientação espacial da idade antiga era horizontal, com valorização da direita, no mundo medieval a orientação se torna vertical, para o alto. E isto por duas razões: aquela do gótico de elevação para as alturas divinas e outra econômica: com as cidades muradas, serão as construções verticais, as torres, a saída para aumentar os espaços próprios num mundo fisicamente delimitados pelos muros: comparem-se as torres de San Gimignano e a verticalidade de Los Angeles. Mas trago para cá duas outras ilustrações, a primeira representação conhecida de uma paisagem urbana, um quadro de Ambrogio Lorenzetti, La cité, de 1346 (Siena, Pinacoteca Nacional) e um quadro de Rainer Fetting, Vue sud de Manhattan, de 1989:
(LEGENDA DA PUBLICAÇÃO: Este quadro é a primeira representação conhecida de paisagem urbana: é uma Manhattan do século XIV. Ambrogio Lorenzetti, La Citè, 1346. Siena. Pinacoteca Nacional – p. 122)
(LEGENDA DA PUBLICAÇÃO: Nova York e a estética urbana da verticalidade sempre inspiram os pintores do século XX. Rainer Fatting.Vue Sud de Manhattan (Nova York), 1979. Coleção do Pintor – p. 123)
E eis aí as aproximações com a cidade moderna que é vertical, com bairros, subúrbios e periferias. Há, no entanto, uma distinção: a cidade moderna se expande, se esparrama, entra “campo adentro”. E em função desta ‘conquista’ de espaço, surgem nas cidades contemporâneas uma gama de novos “centros” e o velho centro cada vez mais, nas grandes cidades, vai se tornando “o centro histórico”, uma espécie de museu a céu aberto.
Resta falar da edição primorosa deste livro: com inúmeras ilustrações. Muitas delas retiradas de iluminuras de difícil acesso para leitores comuns.
Referência: Jacques Le Goff. Por amor às cidades: conversações com Jean Lebrun; tradução de Reginaldo Carmello Corrêa de Moraes – São Paulo : Editora da UNESP, 1998.
por João Wanderley Geraldi | jan 4, 2019 | Blog
– Não, não sou um Palomar a medir uma onda, nem mesmo um Palomar indeciso que, caminhando na praia, se vê surpreendido por uma necessária decisão diante de uma banhista com os seios amostra: deve olhar (um gesto de elogio à beleza?), deve ignorar (um gesto de naturalização do que ainda não se tornou comum?).
Sou nada disso: para o primeiro Palomar, me faltariam reflexões filosóficas e epistemológicas; para o segundo Palomar, me faltariam engenho e arte para criar o erotismo que acompanha as indecisões de Palomar.
Mas vivo à beira-mar. Signifique isso o que possa significar: à beira. E caminho todas as tardes na praia de Barequeçaba.
Na temporada, como agora, enche-se a praia de diferentes pessoas. Como é uma praia sem ondas, e no lugarejo não há bares nem baladas, não é a praia preferida pelos jovens. Ainda que este temporada surpreenda: há jovens por aqui.
Mas predominam mesmo são as famílias recém-formadas, quer dizer, aquelas com filhos pequenos. E estes pequenos que vejo todos os dias variam: alguns têm poucos meses, outros beiram os três anos, e há aqueles miúdos mais crescidos, já frequentando escola. Muitas vezes paro minha caminhada para observá-los: desenvolvidos, os mais crescidos jogam de um tudo, correm para o mar, mergulham, e voltam aos seus novos afazeres, livres da escola e dos horários.
Os menores, estes usufruem da presença dos pais: é muita coisa ao mesmo tempo – os pais disponíveis e à disposição, a areia sem fim, e a água cálida nestes tempos. E eles aproveitam de tudo e sem nunca se darem por satisfeitos. Dentro do mar, sempre querendo ficar para mais uma “onda” (as marolas de nossa praia), e a gente ouve “mais uma!”, “mais uma!” e assim vão adiando a saída, o retorno para casa, o banho com água doce, a janta, a televisão e a cama… ficam e fazem ficar mais tempo.
Ontem percebi uma cena com uma mãe e uma criança com aproximadamente dois anos: vinham saindo do mar, em direção à praia. Não vinham de mãos dadas. Simplesmente vinham juntas. Ao chegar à areia, a criança percebe que a estão tirando do mar. Estaca. Fecha a cara. Como se lhe tirassem o pirulito. Dá meia volta, a mãe chama, e ela foge para dentro do mar… sem remédio, a mãe retorna à água e fica mais um tempo: vitória da menina que volta à felicidade que lhe queriam roubar.
Noutro momento, agora acompanhado de uma amiga portuguesa em nossa caminhada, vimos um garoto: pequerrucho. Estava de cócoras e “enfrentava” com os olhos o mar: avanço? Entro? Tenho coragem? Estático e belo, em cócoras de olhar sério, quase carrancudo. Como quem está diante do inimigo que quer e não quer enfrentar.
Abaixo-me e pergunto: “você quer entrar na água?” Ele me olha súplice, e eu lhe ofereço a mão, entramos. Minha caminhada fica suspensa, mas o menino, entregue aos cuidados de um desconhecido, desconhece estas metas adultas de um enfartado que os médicos mandam caminhar. Para o coração, a alegria de estar com ele é melhor do que qualquer caminhada.
por João Wanderley Geraldi | jan 3, 2019 | Blog
O cotidiano, como todos sabemos, reflete, na sua singularidade, o que há de comum nas percepções e representações de mundo, mas também refrata e no seu caldeirão ao reproduzir também produz os primeiros elementos do novo que ainda não chegou, ou que vem vindo mas que não acreditamos que se tornará hegemônico.
Pensar acontecimentos do cotidiano vivido é uma função do cronista. É a ele que dedicarei meus próximos tempos e começo com a primeira vivência deste fim/começo do novo ciclo a que teremos de sobreviver.
Vivo numa praia. Estamos em alta temporada. Os caiçaras dizem que “os turistas chegaram”. Para mim, veraneio de quem vive longe daqui. Aproveitam o mar – cujas águas estão cálidas. Aproveitam o sol e sairão sobrecarregados de vitamina D, um estoque para o ano das sombras. A alguns, vejo-os vermelhos como camarões: é que todos buscam a cor do verão. Porque o verão tem cores.
Em cada entrada desta praia de Barequeçaba há um grande cartaz anunciando uma proibição: proibido levar animas para a praia. No desenhado, uma pessoa segurando a corda do cachorro com que passeia, dentro de um círculo, com a faixa transversal do “proibido” das placas de trânsito.
Obviamente, há cachorros na praia. Não muitos, mas o suficiente para mostrar que há aqueles que estão acima da lei, aqueles que fazem a lei segundo seus desejos – um costume bem típico de país sem civismo e sem civilidade, esta conquista difícil que não chegou a estas regiões do mundo.
Bocudo que sou, não deixo de reclamar. Aviso aos “passeantes” que cachorros são proibidos, que a praia, em sua democracia, não acolhe cães para que todos – incluindo as inúmeras crianças desta praia de águas calmas – possam usufruir da areia e do mar. Apenas uma vez fui contemplado: uma senhora levou seu cachorro para casa, seguida de seu marido resmungão.
Mas no dia 31 de dezembro me ocorreu uma novidade: pela primeira vez fui xingado de “VELHO!” E o motivo é o de sempre: quando voltava de minha caminhada, entravam na areia duas mocinhas crescidas, cada uma com seu cachorrinho de madame. Apontei-lhes a placa que estava bem à vista, à direita e repeti: “é proibido trazer cachorro para a praia. Está na placa. Sabem ler? Ou entendem o desenho?”
Acontece que um pouco adiantado, também saindo da praia, ia um senhor destes que são o orgulho da nação, ou seja, perfeitos idiotas bem sucedidos e grandes filhos da puta! Gritou que sabem ler e que nesta praia se aguenta muita coisa, e por isso não havia razão para suas rebentas deixarem de levar seus cachorrinhos à praia.
E começou o bate-boca. Respondi que se havia muito coisa a aguentar nesta praia, ele aumentava isso não cumprindo uma regra que era para todos. E lhe disse que ele sabia que não era eu quem estava aumentando esta carga, mas ele! Foi o que bastou para me gritar um “feliz ano novo” com o tom de voz que me mandava para o inferno. Eu Já havia seguido adiante quando ouvi os “bons” augúrios, mas levantei o braço com o dedo em riste, naquele sinal em que mandamos alguém “tomar no cu”. E foi então que ouvi o xingamento:
– Velho! Seu velho! Ficam velhos e ficam babacas! Seu babaca – tudo muito bem gritado.
Grito do meu lado:
– Feliz de você que não precisou esperar a idade!
E segui viagem para meu portão… com a certeza de que ele não entendeu! Afinal, “homens bem sucedidos” têm certas dificuldades para compreender implicaturas.
Mas fiquei pensando melhor: não seria mesmo babaquice querer cidadania numa região do globo terrestre em que cada um somente compreende seus próprios interesses? Não seria mesmo velhice isso de cidadania, de civismo, de civilidade? Babaquice de velho!
E então compreendi a lição: a “nova civilidade” retorna acelerada, tá OK?
por José Kuiava | jan 2, 2019 | Blog
Pronto. “O capitão chegou”! Era grito em delírio na voz de quem mesmo? Ah! A voz do público na planície em frente do Palácio do Planalto. Jair Messias Bolsonaro é o novo Presidente do Brasil. Até ontem, antes da cerimônia de posse, a imprensa falava: “o presidente eleito…” Logo após a cerimônia de posse, a imprensa passou a falar: “o novo presidente do Brasil”. Se eleito, como eleito, em quais condições e circunstâncias históricas de campanha foi eleito… isso não importa mais, isso não vem ao caso. Assim, Bolsonaro chega ao poder por força de uma facada nas tripas. Um pouco antes do Bolsonaro, Temer também chegou ao poder da presidência do Brasil por força de uma facada nas costas da Dilma. Aí está o poder, a força da faca na luta de classes sociais.
Nas cerimônias de posse e transmissão da faixa de presidente, o público delirava aos gritos: “o capitão chegou”! E ele – o capitão sem farda, sem botas militares e sem boné – agradecia com riso nada ridente e gestos ora de união, de força, de solidariedade; ora de mando, de ordem e de continência com os dedos das mãos apontando para frente, simbolizando uma arma em posição de tiro.
Na cerimônia de posse, o primeiro ato real, montado e apresentado no palco do Congresso Nacional, foi vexatório: na mesa de autoridades no ato de posse, dos 12 atores havia apenas 1 mulher. Na plateia foi pior ainda: dos mais de 500 espectadores, não havia 20 mulheres. No ato de transmissão de faixa, no Parlatório do Planalto e na posse dos ministros, havia 20 ministros homens e 2 ministras mulheres. Esse é um dado real. A sensação é que ninguém percebe e nem se preocupa com esta realidade neste momento de posse do presidente Bolsonaro.
Quem assistiu conscientemente com inteligência e visibilidade as cenas de posse e transmissão, viveu um abismo de esperanças, de dúvidas e de desesperanças a um só tempo. Por diversas vezes eu senti náuseas insuportáveis.
Nos dois discursos que o presidente Bolsonaro proclamou, repetiu em tom de ordem militar, no início, no meio e no fim, a frase que enunciava na campanha eleitoral. E muitas outras frases que comprovam sua identidade humana e seu perfil político.
– “Brasil acima de tudo e Deus acima de todos”.
– “Minha vitória, nesse dia em que o povo começa a se libertar do socialismo”.
– Graças a Deus me mantenho vivo e graças a vocês fui eleito na campanha mais barata da história do Brasil”.
– “Vou acabar com a ideologia que defende bandidos e criminaliza policiais que combatem os criminosos”.
– “Todos queremos um Brasil melhor. Não podemos deixar que ideologias nefastas destruam nossas famílias”.
– “Aqui está a bandeira verde, que jamais será vermelha”.
– “Quero uma educação com crianças formadas para o mercado de trabalho e não para a militância política”.
– “Vamos reerguer a Pátria, libertando o Brasil da conspiração e do domínio ideológico”.
– “O Brasil voltará ser livre das amarras ideológicas”.
– “Nossas Forças Armadas terão nossa força para cumprir sua missão de segurança”.
– “Não vou gastar mais do que arrecadar”.
– “Vamos abrir nossa economia para o mercado internacional”.
– “Vamos superar a pior fase do Brasil que já vivemos”.
O agora presidente do Brasil, Bolsonaro, falou e disse essas coisas e muitas outras falácias em tom de promessas num horizonte passado e ultrapassado.
Diante de tudo isso, preciso lembrar ao agora presidente Bolsonaro que se “o discurso empolga, o exemplo arrasta”. Logo, o bom exemplo de conduta humana deve vir de cima.
O capitão e o coronel chegaram.
por João Wanderley Geraldi | dez 31, 2018 | Blog
Ensina uma autoridade federal que se deve sonegar tudo o que for possível, ao nos dar o exemplo: “Eu sonego tudo que for possível”. É bem verdade que para aqueles que vivem de salários, que não são “homens de negócios”, a sonegação é quase impossível, mas há possibilidades de uma ou outra informação semiverdadeira para dar conta de cumprir o preceito exemplar do futuro presidente.
Mas os “homens de negócios” têm mais chances, entre outras até de apropriação indébita: recolhem as contribuições e impostos de seus empregados, mas esquecem de depositá-las para o fisco. Em geral fica por isso mesmo… e alguns anos depois, uma confissão de dívida e um prazo de uns 100 anos para pagar.
Mas “homem de negócio” mesmo, aquele que somente ganha dinheiro, quer dizer, “faz dinheiro” é aquele que não precisa se estabelecer com endereço comercial, registro no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas: nenhuma complicação. Somente fazer dinheiro. Não tem gastos de aluguel, não tem gastos com salários, não tem gastos com taxas e impostos. O telefone e a conta bancária são seus endereços naturais.
Melhor ainda é “o homem de negócios” que tem clientela fixa, que paga mensalmente sem qualquer incômodo: todos os meses, religiosamente, estes clientes recebem seus salários e imediatamente depositam na conta do “homem de negócios”.
Ser um homem de negócios desta ordem é o sonho de qualquer sujeito com espírito empreendedor. O que não sei é se os cursos de empreendedorismo ensinam a mágica de fazer dinheiro cativo, com clientela cativa, e ainda gozando da possibilidade de amigo que lhe empresta dinheiro para pagamento quando der, quando puder.
Seria sonho? Não, no Brasil, há um homem de negócios que tem todas estas vantagens. E a patuleia acredita e inveja… porque é bom acreditar no que acreditam autoridades como o Ministério Público Federal. Eles dão o exemplo de crença necessária no mundo que inicia este novo ciclo com Deus presente, como nos ensina o novo chanceler diplomata Araújo, ara, ujo!!!
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