– Você acredita nos nossos políticos?
– O que? Eu acreditar nos políticos de hoje? Pensa que sou tão idiota assim?
– Mas você não votou neles?
– Que nojo! Nojo! Tenho vontade de vomitar até as tripas quando me lembro que votei neles!
– Você não confia neles?
– Eu confiava. Acreditava que eles iriam trabalhar honestamente, se empenhar para o bem do povo, para uma vida melhor de todos, principalmente dos mais necessitados. E o que eles fizeram e continuam fazendo? Roubaram e roubam o que é de todos. Seus nojentos!
– Sim, mas estão indo pra cadeia!
– Quem tá indo pra cadeia? Quantos? E porque estes poucos estão na cadeia?
– Então, você não acredita mais na política, nos políticos, nos partidos políticos… em ninguém desta turma?
– Quero ficar longe de tudo isso! Vou viver minha vida. Quero ficar longe dos canalhas. Quero me livrar destes velhacos. Ficam promovendo promotores, nomeando juízes, desembargadores, procuradores – todos grandes amiguinhos – para serem protegidos amorosamente dos crimes no poder supremo. Lá, onde se condena e prende os trabalhadores e se liberta os engravatados de colarinho branco.
– Sim, mas hoje tem gente de colarinho branco na cadeia.
– E você não percebeu que é mais um golpe! Um espetáculo para o povo acreditar neles. Uns anjinhos!
– Mas, os partidos políticos, como escreveu Antônio Gramsci, são o “Príncipe Moderno”, necessários para o caminho da democracia, quer dizer, são indispensáveis para a construção do estado democrático.
– Então, quer dizer que temos 34 “Príncipes Modernos” no Brasil de hoje? Que fortuna! Para mim, partidos políticos são verdadeiros “currais de esgoto”, cheios de excrementos humanos. A cada golpe, pintado de ouro falso, que eles praticam contra o povo, desbundam a galera televisiva, que fica cada vez mais depressiva. É claro, por que omissa!
– Você, então, não faz parte de nenhum partido político? Porque?
– Claro que não! Deus me livre desta podridão fedorenta! Que se fodam todos, mas longe de mim.
– Mas, se os partidos são currais de esgoto humano, quem vai limpá-los? Ou, quem vai criar, organizar e manter outros partidos limpos, de águas cristalinas potáveis, puros?
– Bodeguero! me traga mais uma doze da marvada! E bem cheio, viu. Único alento que me sobra.
Esta conversa imaginária, nada honrada sobre política e políticos, não acontece somente no mundo alentador dos botequins pelo Brasil afora, ao sabor de cachaça, vodka, cerveja… Acontece, e muito, nas ruas, praças, nas fábricas, nas lojas, nas escolas, nas universidades, nas igrejas, nos estádios, enfim, esta conversa acontece na boca do povo.
Não acreditar em alguns políticos, desonestos e corruptos, na multidão de políticos e partidos de uma nação, é um estado salutar e alentador das massas populares de uma sociedade. É uma prova de conhecimento, discernimento e de consciência política do povo, que sabe distinguir os políticos corruptos, desonestos, mentirosos, golpistas dos políticos honestos, éticos e comprometidos com o bem estar da sociedade e defensores do bem comum – a democracia viva, participativa.
Agora, quando uma sociedade, quase por inteiro, não acredita nos políticos, que elege, em sua totalidade e, consequentemente, não acredita na política como condição essencial e imprescindível da democracia “substantiva”, aí já é uma depressão generalizada, contagiante e transmissível oralmente de boca-em-boca pela sonoridade do linguajar popular. Em estado crítico, se torna uma epidemia generalizada pela omissão. Contestar, protestar, denunciar, indignar-se com os golpistas e os golpes que eles praticam diuturnamente, é uma condição necessária, é fundamental e é essencial, mas não é suficiente para garantir as mudanças para as transformações sociais, políticas e econômicas, necessárias ao bem estar de todos de uma nação.
Primeiro, e acima de tudo, é preciso a participação efetiva, permanente e continuada da população na política do país.
Professor, pesquisador, escritor
José Kuiava é Doutor em Educação pela Faculdade de Educação da Unicamp (2012). Atualmente é professor efetivo- professor sênior da Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Planejamento e Avaliação Educacional, atuando principalmente nos seguintes temas: autobiografias.inventário da produção acadêmica., corporeidade. ética e estética, seriedade, linguagem, literatura e ciências e riso.
José,
talvez eu seja mesmo uma otimista sem cura, mas não são só diálogos como esse que eu ouço vindo de classes mais baixas. Ouço murmúrios de ódio de pessoas que se sentem roubadas pelo golpe de 2016, que, sem sequer saber ler e escrever, sabem muito bem de cada nova privação e conseguem até mesmo imaginar o quão pior isso pode ficar. Ouço a Maria, me contando das conversas nos ônibus, em que pessoas, que em 2016 achavam que estava tudo certo, agora debatem, assustadas e revoltadas, essa realidade que se apresenta. Se não fossem essas Marias, eu certamente estaria cega para esses murmúrios e muito doente. Não conseguiria sair pra trabalhar numa universidade pública, que já começa a quebrar, dar aulas para alunos que não tem dinheiro nem para o ônibus e ainda sofrem preconceito de colegas e professores que apenas desconfiam que sejam cotistas. Mas saio de cabeça erguida, graças a essas Marias.
Precisamos, sim, que a população seja ativa, concordo contigo, só queria dizer que não podemos calar os oprimidos que apesar de tudo, estão em pé, conscientes e alertas, não se deixaram abater e querem ser ouvidos. Que continuam levando seus filhos pra escola pública sonhando para eles um futuro muito melhor do que este que se nos apresenta.
Obrigada por sua reflexão.
Ana
Ana,
Com suas análises me sinto bem mais alentado. Precisamos continuar nas análises críticas juntos e sempre de cabeças erguidas.
Obrigado
Kuiava