“Meu boi Barroso, meu boi Pitanga, o seu lugar é lá na canga…”. Esta velha canção que ouvia quando pequeno não me sai da cabeça e não sei o que a me traz do fundo da memória para o presente. Enfim… ela ainda não foi proibida e posso pensá-la à vontade.
O processo eleitoral está mexendo com aqueles que detestam qualquer manifestação popular, particularmente através do voto, que não corresponda aos seus pontos de vista e aos interesses envolvidos na condução política do país.
Barroso, o ministro, parece detestar Lula – embora tenha sido nomeado pela petista Dilma. Está tão encurralado com o que tudo está indicando – uma vitória do PT nas eleições, seja o candidato quem for – que gostaria imensamente de retirar da política o nome de LULA. Proíbe imagem, proíbe fala, mesmo de gravações anteriores à prisão; proíbe que candidatos ao Parlamento citem o apoio de Lula e a Lula, sequer solidariedade pode ser manifestada. Em resumo, o ministro Barroso, não aquele cujo lugar é na canga, aquele da canção, quer apagar um líder, custe o que custar.
Resta saber se pretende também retirar a palavra “lula” do dicionário! É que no freezer da minha casa temos lulas e estou preocupado com uma batida da polícia federal a mando de Sérgio Moro, porque o pacote está identificado com a palavra “lula”, e se ela for proibida, então não terei mais lulas no freezer, e quando fizermos a comida – provavelmente um arroz com… – a gente vai comer “arroz com…” até que o Barroso decida que podemos voltar a usar esta excluída palavra…
Acontece que como o bicho lula, Lula tem mil tentáculos, mil modos de existência na cabeça do povo, e a grande maioria com simpatia, com vontade de que ele retorne ao governo, etc. etc. Como o Lula disse, ele é uma ideia e ideias, mesmo o Barroso querendo, não vão para canga, isto é, não se submetem aos desejos inconfessáveis dos interesses escusos que sustentam o golpe que o judiciário brasileiro insiste em manter, insiste em continuar realizando, dia a dia e a cada processo. Como o judiciário não tem a força bruta direta, vai comendo pelas beiradas a democracia brasileira.
Mas há quem tem a força, a força bruta, bélica, concreta: tanques e canhões, munição e guaritas, fardas e pessoal. E aí entra em cena a tão comentada entrevista do Gen. Villas Boas, ministro Chefe das Forças Armadas. Segundo alguns analistas, sua fala se destinava ao público interno, onde as águas se agitam há muito tempo. Diz aos companheiros de farda: estou atento, podem deixar… mas diz isso com a força de impor o desejo das águas agitadas: a candidatura Lula não passa, não pode acontecer, não deve acontecer, não QUEREMOS que aconteça.
Agora sim apareceu um homem com força de dizer que o golpe pode se aprofundar, e o regime deixar de ser uma ditadura jurídico-policial, sustentada pela mídia tradicional, para se tornar pura e simplesmente uma ditadura militar, com as imposições de praxe, manu militari. O General não precisa dos rodeios do juridisquês falado, escrito e despachado pelo Sr. Faccioso, aquele ministro que diz que uma liminar da ONU vale no Tribunal Superior Eleitoral, TSE, mas não vale no Supremo Tribunal Federal. Nem precisa se mostrar com a cara braba de professor sádico que gosta de dar castigos, cara que sempre apresenta o Barroso, o ministro fique claro. Villas Boas fala sério. E diz a que estão dispostas as casernas… Ou chegamos ao poder executivo pelo voto no nosso candidato (venha ele a ser substituído por Mourão ou não), ou chegamos ao poder porque vetaremos qualquer candidato outro, e o outro único que tem chances, neste momento, é Fernando Haddad, representando Lula nestas eleições.
Está criado o clima: o STF que veio com “tudo” para o golpe parlamentar de 2016, que assumiu o comando do golpe através de seus ministros arrependidos e chorosos por terem sido nomeados por petistas, ansiosos para prestarem serviços à direita que lhes convém, acabará perdendo o poder. O Gen. Villas Boas avisou quem deve governar. “E se não for o seu candidato o eleito, então daremos um jeito.” Haddad se elege e não leva? É esta a mensagem?
Nunca tive dúvidas de meu voto: voto em Lula, voto em Haddad. Depois destes acontecimentos voto com mais vontade ainda em quem Lula indicar, pode ser até uma minhoca qualquer! E voto mesmo não precisando mais comparecer às sessões eleitorais, porque estou dispensado da obrigatoriedade do voto… irei votar e irei de camisa vermelha (aliás, uma camisa que ganhei de um colega na Universität de Siegen, na Alemanha, quando estava por lá trabalhando, logo não partidária, mas vermelha – me basta).
João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.
Geraldi,
Bravo! até repassei para algumas colegas o texto – escolhidas a dedo, porque não sou de fazer spam, não acho que compartilhar seja legal quando a gente simplesmente joga as coisas ao vento, como se faz no facebook, que já não aguento mais usar.
Eu já disse aqui, tempos atrás, quando nem tinham começado as pesquisas da eleição, que o povo sabe, que o povo viu o que aconteceu nos dois últimos anos e não esqueceu os 12 anteriores, porque viveu isso na pele, na comida na mesa, na oportunidade da casa pŕopria, nos filhos indo pra escola e até pra faculdade pública. E mais, eu disse que as Donas Marias, como a minha companheira, mãe mineira que me acompanha há tantos anos, não iam abrir mão da vida que, como lhes foi negado a vida inteira, puderam passar a sonhar para seus próprios filhos. E as pesquisas estão aí, mostrando que é isso mesmo. Espero francamente que esses sonhos ainda possam encontrar eco em tempos melhores que os que estamos vivendo agora.
Beijos,
Ana
Cara Ana, obrigado por seu comentário. O Brasil tem milhares de D. Marias que compreenderam que outra vida é possível. E aqueles que não perderam nada, mas que tiveram que acolher novos convivas no mundo, estão em pé de guerra, como se a redução dos recém incluídos ao mundo miserável anterior os fizesse mais ricos, mais prósperos… Pelo contrário. Mas o ódio a pobre, no Brasil, vem desde o Brasil-Colônia.