Bolívia: e se a ‘moda’ pega? Como reagirão os generais das aproximações sucessivas?

Os generais brasileiros, aqueles das ‘aproximações sucessivas’ devem estar babando de inveja dos generais bolivianos. Mas terão que engolir a inveja: eles patrocinaram o governo que aí está; eles estão no governo como nunca estiveram (na ditadura militar havia menos militares nos ministérios do que hoje, e lembrem que na época havia três ministérios militares: Exército, Aeronáutica e Marinha!).

Já escrevi aqui que os ventos do Pacífico poderiam não ser bons… Os ventos da Bolívia são putrefatos, porque um golpe militar na América Latina estava fora das possibilidades segundo a maioria dos analistas. Pois não está fora dos horizontes. As ditaduras militares não estão fora do horizonte, para dizer mais claramente, pois a sanha se espalhará entre generais golpistas, que os há em todos os países.

O mapa da América do Sul nos mostra uma região em ebulição. Venezuela na frente: um governo que se sustenta em sua base popular, apesar do boicote norte-americano e da direita fazendo pressão contínua. No Paraguai e depois no Brasil houve golpes com arremedos de institucionalidade. No Equador, o governo eleito com os votos dos progressistas trai o programa que o levou ao poder e começa a implantar a política econômica neoliberal: o povo foi para as ruas. O Chile em convulsão, depois de 40 anos de arrocho neoliberal. E não se enganem: a dívida pública chilena cresceu durante todo o período dos ajustes e dos pagamentos de juros (mas parece que o Paulo Guedes não gosta de olhar números macroeconômicos dos países que quer imitar com sua política suicida).

Ainda estávamos respirando os bons ventos da reeleição de Evo Morales na Bolívia e de Fernandez na Argentina; torcendo pela Frente Ampla do Uruguai, que vai a segundo turno disputando com a direita e com Lula fora da cadeia depois que o STF aprendeu a ler a Constituição e a maioria apertada da corte deixou os punitivistas legisladores e autoproclamados constituintes em minoria (entre eles o execrável Faschin, com essa grafia para lembrar o fascista que é).

Pois os generais exigem a renúncia de Evo Morales. Enquanto porta-vozes da direita, faziam exigências; mas o grupo político de sustentação, o fundamentalista de direita Camacho e seus companheiros incendiavam as casas do vice-presidente, do presidente do Congresso boliviano, e assim por diante. Mesmo com o povo nas ruas, os soldados tendo que enfrentar irmãos e pais, o golpe de estado foi dado!!! E os generais estão assanhando outros generais, podem crer.

O Brasil escapará desta ‘moda’ que vai pegar? O capitão já não governa, somente faz bagunça. Paulo Guedes tenta entregar tudo… mas nem o capitalismo pretolífero está querendo entrar na canoa furada deste palavrão Bolsonaro. Há instabilidade provocada pelo próprio presidente e seus filhos e seus milicianos (ou alguém não percebeu o recado do Queiroz para o presidente, falando em empregos nos gabinetes do Legislativo?).

E Lula irá para as ruas e levará gente para as ruas. Como reagirão os generais?

João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.