As delações indesejadas: Eduardo Cunha e Andrade Gutierrez

Se tico e teco funcionassem, os das panelas, camisas amarelas e bandeiras desfraldadas poderiam compreender alguma coisa, ao menos a partir do noticiário desta semana. Mas pôr para funcionar o tico e o teco é pedir exageros a globodiotas. E entre eles, poucos leem até mesmo suas revistas preferidas, a OIA e a ISTOFOI.

Chega ser comovente o arrependimento tardio de executivos da Andrade Gutierrez e de Eduardo Cunha. Os primeiros queriam complementar sua delação. Perguntados se traziam fatos comprováveis contra Lula, cometeram o engano de dizer a verdade: nada tinham contra Lula. Eles não aprenderam a lição dada por Leo Pinheiro, que depois de dizer que o tríplex era da OAS, desdisse o que disse e declarou que pertencia a Lula. Por esta declaração sem provas – mas provas é o que menos importa no caso da perseguição a Lula – Leo Pinheiro ganhou as benesses da delação. Os imbecilizados executivos da Andrade Gutierrez foram incapazes de compreender o rumo das coisas. Deveriam ter dito: temos muito a mentir sobre Lula, e nossas mentiras são provas para as sentenças bem-fundadas de Sérgio Moro. Assim que dissessem isso, teriam direito à complementação que pediam.

O mais incrível desta história é que os procuradores da Lava Jato informaram a pergunta que fizeram e a negativa dos delatores foi suficiente para não aceitar nova delação e novos termos no acordo! E ficou tudo por isso mesmo!!! Ah! Como seria bom se o tico e o teco funcionassem para que os imbeciloides, que ainda acreditam que há um combate à corrupção, melhorassem um pouquinho seu nível intelectual, elevando-se acima da imbecilidade a que a mídia tradicional os conduziu.

Depois desta notícia escandalosa, sem que escândalo houvesse, surgiu a recusa da delação de Eduardo Cunha!!! O cara é um cofre de informações. Participou das maiores falcatruas da história recente do país! No entanto, segundo os sapientíssimos procuradores, ele nada acrescentaria ao que já sabem pelas delações de outros!!!

Se associarmos este fato à insistência de Michel Temer de que a JBS deveria manter – e que era preciso continuar mantendo – a “doação” ao presidiário Eduardo Cunha, como compensação pelo seu silêncio, teremos as verdadeiras razões da procuradoria da Lava Jato para a recusa da delação de Eduardo Cunha. Ele jamais pertenceu aos círculos petistas, e suas acusações, sua deleção, provavelmente iriam para endereços errados, comprometendo quem não deve ser comprometido, estilo Aécio Neves, José Serra, Romero Jucá, Moreira Franco, entre outros menos votados. E, obviamente, seu amiguinho íntimo de golpe, Michel Temer, este mais sujo que pau de galinheiro, mas dono da caneta da liberação de emendas e de cargos para comprar sua inocência enquanto estiver na presidência. Como seu período acabará, tudo vai para a justiça comum e nela todas as chicanas serão feitas por advogados bem pagos, e tudo ficará nos “autos” e sem deles sair, como aconteceu com o mensalão do PSDB lá na justiça mineira…

Os procuradores da Lava Jato estão escrevendo uma página da história do país. E a História a desvendará. De heróis do presente, tornar-se-ão os vilões do futuro. Ainda que enriquecidos por seus trabalhos de palestras e pregações país afora, valores necessários à sobrevivência já que os salários estão baixíssimos, como todos sabem e até o Conselho Nacional de Justiça se viu obrigado a suspender certos contracheques… Mas há outros enriquecimentos que cupim algum pode comer: os conhecimentos que adquirem em seus constantes cursos e viagens aos EEUU. Voltam sempre mais empanturrados de informações e conhecimentos, mas jamais chegam à sabedoria, pois esta é, como disse um dia Walter Benjamin, o lado épico da verdade, e se a verdade pouco lhes interessa – como mostram o “não querer saber” das delações de Eduardo Cunha e dos executivos da Andrade Gutierrez – não é possível a ela agregar o épico!

E enquanto estas vergonhas se expõem à luz do dia, as panelas estão nos paneleiros e armários, as camisetas amarelas nos guarda-roupas e as bandeiras devidamente dobradas e guardadas, e tudo isso só ganharão vida nas ruas no dia da prisão de Lula, o desejo efetivo e recôndito de uma classe média medrosa de perder as migalhas que a elite brasileira lhes deixava, porque seriam repartidas pelos desafortunados que Lula teve a ousadia de trazer ao mundo do consumo, ainda que esquecendo de trazê-los para o mundo da política.  

João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.