A INVENÇÃO, de Cícero Souza

Este é o meu invento:

Com ele estarão extintas todas as dúvidas e certezas:

Este é o meu invento:

Com ele acabaremos, como é desejo de todos,

Com a miséria e os miseráveis, a fome e os famintos.

Este é o meu invento:

Com ele destruiremos o concreto e o torto,

O reto e o abstrato.

Este é o meu invento.

Devemos estar atentos, pois ele estará em todos os lugares:

Nas padarias, nas farmácias, nos mercados, no banheiros,

Nas bibliotecas, embaixo da cama, nos bares, escolas

Praças, escritórios…

Este é o meu invento.

De nada adiantarão as ciências, religiões, poesias, filosofias

Para nada servirão tua indignação, teu grito, teu espanto.

Este é o meu invento.

Será inútil teu sorriso, tua arte, o teu pranto.

Com ele, enfim, exterminaremos com tudo o que resta,

não haverá mais necessidade de sonhos e ou realidade de

tempo ou espaço.

Este é o meu invento.

Ele nos levará ao nada, ao vazio, ao silêncio.

(Cícero Souza, Amor, saliva, palavras. Rio de Janeiro : Editora Multifoco)

João Wanderley Geraldi é reconhecido pesquisador da linguística brasileira e formou gerações de professores em nosso país. Há já alguns anos iniciou esta carreira de cronista-blogueiro e foi juntando mais leitores e colaboradores. O nome de seu blog vem de sua obra mais importante, Portos de Passagem, um verdadeiro marco em nossa Educação, ao lado de O texto na sala de aula, A aula como acontecimento, entre outros. Como pesquisador, é um dos mais reconhecidos intérpretes e divulgadores da Obra de Mikhail Bakhtin no Brasil, tendo publicado inúmeros livros e artigos sobre a teoria do autor russo.