Certa manhã de sol reluzente e céu azulado, natureza linda, eu estava na minha biblioteca, em silêncio solitário, lendo “Como as Democracias Morrem”, livro dos professores Steven Levitsky e Daniel Ziblatt. Um livro importantíssimo e emblemático – polêmico – para os tempos do populismo de direita dos governos autocráticos, que estamos enfrentando assombrados.
De repente, escuto um zunido de algo voando por cima da minha cabeça. Fiquei intrigado e me perguntei: como pode ter inseto no sétimo piso de um prédio? Olhei melhor e vi uma abelha subindo e descendo, indo e vindo. Aí tive pena e ofereci a minha mão pra ela.
Ela veio vindo de mansinha e pousou na minha mão. Começou lamber o meu dedo. Aí, fiquei intrigado de novo. Será que o meu dedo está sujo de mel ou de qualquer outra coisa? Olhei com carinho e fiquei com dó da abelha. Corri para a cozinha e meti o dedo no pote de mel. Ah! A abelha ficou animadíssima! E começou a comer. Um amor. Me deu vontade de beijá-la. Mas fiquei com medo, ela poderia se entusiasmar e me beijar com o ferrão dela, que fica bem na ponta da bundinha, em estado de prontidão e defesa.
Já de barriga cheia de mel a abelha voou, muito pesada e com dificuldade de voar.
Tempo depois, começaram chegar dezenas de abelhas para comer mel. Tive que colocar mais mel em 3 janelas. Acontece que a abelha foi chamar as irmãs operárias e ela na frente indicou o caminho do mel. Parei de ler sobre a morte das democracias e fiquei me entretendo com as abelhas.
Pois é, essa história real e verdadeira me intrigou muito e me fez pensar nas condições da vida no Planeta Terra. De imediato, fui atordoado por uma pergunta: porque as abelhas com fome vieram buscar comida – mel – num prédio, todo de cimento, ferro, tijolos, … em vez de ir buscar o mel, o néctar, a cera e a geleia real nas flores das florestas, dos pomares, dos jardins… E aí, começou vir a parte triste do meu sentimento: as condições naturais da vida, que estão virando em tragédias naturais e humanas.
As abelhas fazem parte dos seres vivos – animais, insetos – que mais estão sofrendo a destruição das condições de vida no planeta. As matas e as florestas já reduzidas e em processos de destruição e desmatamento – derrubadas, queimadas, soterradas… sem fim, sem limites, sem controle…Os jardins, os pomares, as plantações de cereais, de verduras… o agronegócio envenena dia e noite sem limites. As águas dos rios, dos lagos e dos mares recebem milhões de toneladas de lixo humano por dia.
Por conta disso, os insetos, os pássaros, os animais silvestres morrem envenenados. Há espécies, e muitas, em estado e processo de extinção. Quantas tartarugas, quantos peixes, quantos golfinhos, quantas baleias estão morrendo com o estômago cheio de plástico. Tudo por força e em nome do “progresso humano”.
No Brasil de hoje, as coisas estão cada vez mais assustadoras. O governo Bolsonaro instituiu o “liberou geral”. Sem limite, sem controle, sem multas, estamos no caminho do colapso ecológico. Os desastres ambientais com tragédias humanas são verdadeiros crimes por força da ganância na extração de minérios, madeira, petróleo, água e outros bens naturais – comuns de todos.
O sociólogo do IBASE, Cândido Grzybowski, em uma de suas crônicas escreveu:
Um elemento mais sistêmico em termos de destruição do agronegócio é sobre os insetos, que estão na base de toda a rede de interdependências que faz a vida conseguir ser vida. O caso das abelhas é o mais emblemático, tanto na produção do mel e seus derivados como, sobretudo, na polinização de todas as plantas. São alarmantes as notícias de mortandade de abelhas, que se conta em bilhões, devido à contaminação das lavouras. Estamos atingindo um dos pilares da sustentabilidade da vida. E temos ainda que ver o agronegócio defender que agrotóxicos são fitossanitários. Até quando vamos aguentar tal governo?
E nós consumidores sem limites, não estamos nos dando conta dessas tragédias. Embora haja movimentos, manifestações, protestos no mundo, mas ainda poucos e insuficientes.
No dia 16 de abril de 2019, uma adolescente/jovem de 16 anos proclamou ao mundo: “Nós nunca mais vamos deixar de lutar em defesa da vida do planeta terra”. Esta é a convocação universal.
Professor, pesquisador, escritor
José Kuiava é Doutor em Educação pela Faculdade de Educação da Unicamp (2012). Atualmente é professor efetivo- professor sênior da Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Planejamento e Avaliação Educacional, atuando principalmente nos seguintes temas: autobiografias.inventário da produção acadêmica., corporeidade. ética e estética, seriedade, linguagem, literatura e ciências e riso.
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