por João Wanderley Geraldi | out 31, 2016 | Blog
Acompanhar maravilhado o crescimento de uma criança é a experiência maior que nos é dada pela sorte e pela natureza. Não há olhar atônito, há olhar curioso. E um olhar que nomeia e ao nomear cria um mundo de fantasia em que reina sem absolutismo, porque a parceria com seu outro – o adulto – compõe paisagem e personagem destas nomeações do mundo, já não mais adâmicas porque o que é individual no reino da fantasia se deixa penetrar pelos parceiros com que a criança brinca.
É claro, há brincadeiras solitárias num mundo fechado em que ela reina absoluta, mas a linguagem com que refere, ela já sabe, é também do outro mesmo que o outro dê nomes distintos ao que ela nomeia com nomes outros, fazendo entrecruzarem-se realidades distintas que perdem a distinção: toda criança sabe que no “upa, upa, cavalinho” no pé de um adulto, o pé não é um cavalo e ao mesmo tempo é um cavalo.
Neste reino a lógica da igualdade não funciona. O que funciona é a lógica da metáfora, da ultrapassagem dos limites com que lidam os adultos quando estão sérios. Nem eles, quando brincam com crianças, com filhos e netos, filhas e netas, aceitam limites referenciais que amortecem (no sentido radical da expressão, dão morte) ao mundo.
Pois é neste terreno que trabalha o livro UM PÔNEI CHAMADO CAVALO (Cânone Editorial, 2014), de Alexandre Costa e Santiago Régis. Uma beleza armada de cotidiano. Seus personagens se chamam Fulano Pai e Fulano Filho, com que pretendem lidar com as relações entre pai e filho. Neste texto de literatura infantil – com o qual os adultos têm novo acesso a si próprios – correm livres vários aspectos do mundo contemporâneo. Os autores realçam três deles.
Primeiro, a família triádica de pai-mãe-filho desaparece. Fulano Filho é filho de pais separados. Não mora com o pai. Talvez com a mãe, mas isso pouco importa à história narrada. E este contato periódico, mas não cotidiano entre pai e filho, lhes permite construir um tempo somente deles.
Moacir Gadotti escreveu, depois de sua separação, sobre a dialética do amor paterno. Parece que ele se torna mais visível quando os encontros entre pai e filho se dão sem a intervenção do cotidiano. Cada encontro é uma festa. Cada festa é uma lembrança, uma memória.
Em segundo lugar, as personagens são afrodescendentes. São pardas. Pai e filho em tudo iguais – “um o focinho do outro” – estão marcados pela cor da pele em toda a ilustração. Este dado real nos coloca de imediato diante de outro dado, aquele da exclusão étnica mesmo em contos e narrativas infantis.
Os autores enfrentam aqui o preconceito social, ao mesmo tempo que o calam. Não se trata de livro militante. Trata-se de livro que traz para as páginas da literatura infantil personagens presentes e ao mesmo tempo esquecidas de nossas vidas.
Por fim, o texto destaca com clareza a plurissignicação religiosa do mundo. Ao remeter à canção que pai e filho escutam de Jorge da Capadócia, de São Jorge, também chamado Ogum, permite que se tenha não um sincretismo religioso, mas uma visão distinta sobre uma mesma personagem histórica que, apesar de ter perdido por obra e graça de João Paulo II o codinome de Santo, iluminou o mundo e se tornou objeto de reverência. São Jorge – insisto no São – em seu cavalo enfrenta o dragão.
Aqui os autores também sabiam que estavam enfrentando um dragão. Ao referenciar uma mesma personagem histórica com dois nomes e, portanto, com dois sentidos distintos segundo ensina o matemático G. Frege, fazem eclodir o radicalismo e o fanatismo religioso, não daqueles que chamam Jorge de Ogum, mas daqueles que chamam Jorge de São Jorge! O pentecostalismo jamais perdoará a existência de outros nomes para as mesmas realidades…
Certamente este livro deve ter encontrado dificuldades de circulação, mesmo escolar, em função da interdição que estes três aspectos podem suscitar em espíritos mais ou menos tacanhos que, de Bíblia em punho, leem o Antigo Testamento em busca de um Deus irado e vingador.
E no campo da vingança divina de que eles se julgam expressão, não é possível admitir a leitura de um texto em que há pais separados, em que as personagens pertencem a uma minoria étnica (minoria só economicamente) ainda que estes mesmos sujeitos de Bíblia em punho sejam negros ou pardos (o Deus de sua representação é branco e com ele querem se identificar). E, como se não bastasse, novamente, a presença de São Jorge/Ogum lhes é ainda mais abominável.
No entanto, e precisamente pelos mesmos motivos da interdição, o livro, pela ilustração e pela história, mereceria leitura de todos os pais, separados ou não; de todas as crianças para recuperarem seus pais e suas afinidades; em todas as escolas para aprenderem que o mundo não é definido por um único discurso nem por uma única realidade.
Um pônei pode ter por nome Cavalo, um filho pode ter por nome Filho e um pai pode ter por nome Pai. E Filho e Pai podem brincar de cavalos, muitos cavalos com almofadas, com travesseiros, com vassouras: tudo será cavalo se a imaginação assim o quiser quando se brinca e se apreende o mundo neste gesto tão humano da nomeação criativa.
por João Wanderley Geraldi | out 31, 2016 | Blog
Inegavelmente nenhuma liderança se faz por decreto ou por herança. Ela se constrói na prática em qualquer área da atividade humana. Um cientista se torna líder e faz escola precisamente porque é pesquisador e trouxe alguma inovação. Um escritor jamais será referência para outros escritores se não tiver escrito livros. Suas inovações podem ou não construir escolas, mas se sua criação não tiver vínculos com um passado esquecido e não tiver renunciado à continuidade do existente no presente, ela não se constituirá como referência. Até mesmo num pelotão militar, no momento do ataque ou da defesa numa guerra, emergem lideranças que concretamente, ali durante a ação, superam as hierarquias militares. Assim é também nos movimentos sociais. Uma liderança não se impõe de fora para dentro, mas emerge dentro da ação.
Nas ocupações das escolas estão emergindo lideranças. A jovem estudante paranaense Ana Júlia enfrentou senadores e raposas da política precisamente porque se faz líder antes de se tornar uma imagem em vídeo fazendo sucesso nas redes sociais.
Obviamente, apareceram os detratores de sempre. Batedores de panelas não admitem o surgimento de lideranças que pensem o contrário do que pregam MBL, Vem-para-rua e outros menos aquinhoados com financiamentos dos Irmãos Cohen e do PSDB. E surgem duas acusações contra Ana Júlia: ser filha de militante petista e a de ter decorado o discurso que proferiu.
Qualquer um que conhece um pouco das diferenças entre a oralização do escrito e a oralidade percebe, pelas dúvidas, pelas pausas, pela busca da expressão que suspende a fala até que emerja a palavra buscada, que o discurso proferido por Ana Júlia não foi decorado a partir de um texto escrito. Mas certamente qualquer um sabe que ninguém de sã consciência, representando um movimento como o das Ocupações de Escolas iria para uma tribuna sem ter anotações, sem ter conversado com colegas, sem ter pensado o que diria. Nenhum orador fala a partir de um improviso absoluto, até porque se fora assim, não falaria. Ao levantar-se para falar, se chamado sem esperar, já elabora mentalmente um esquema de fala.
A outra crítica, de ser filha de um militante petista nem mereceria resposta! Todo mundo é filho de alguém! E muito orgulhoso deve ficar o pai de Ana Júlia ainda que discordem em alguns pontos de vista. Mostra o fato apenas a existência de diálogo dentro de uma família, o que deveria e poderia ser uma constante em todas as famílias não tivéssemos nós duas restrições que impedem este diálogo: a extrema desigualdade de condições de vida que faz muitos pais e mães encontrarem seus filhos por poucas horas durante o dia e sempre com afazeres domésticos de permeio; e na elite e classe média que a aplaude, esta figura austera e autoritária do chefe do clã, do pai que diz a verdade e o credo a ser seguido. O patriarcado e seu sucedâneo, o patrimonialismo.
Certamente esta acusação, ser filha de…, encontrou terreno fértil nas redes sociais face ao ódio indiscriminado a toda e qualquer militância social. Mas ela mereceu também críticas. Tomo emprestado um post do Facebook de Walter Caldana, a que se seguiu um debate bastante acirrado. Eis o post:
Num país onde aécio é neto de tancredo, onde eduardo é neto de arraes, onde bruno covas é neto e zuzinha é filho, onde mais da metade dos parlamentares federais são parentes de primeiro ou segundo grau de outros parlamentares ou de políticos com mandato, onde acm neto é neto, onde sarney filho é filho, onde zeca é do dirceu, onde o beto é richa, o marchezam é marchezam e onde o joão dória é júnior … recebo um post dizendo que a menina de curitiba é industriada e manipulada por que seu pai é petista! (Walter Caldana)
Tem toda razão Walter Caldana em mostrar a hereditariedade presente na política brasileira. Por que ela é possível? Porque o espírito da Casa Grande permanece como força motriz da estrutura de nossa sociedade. Os “netos” e “filhos” que se tornam deputados, senadores ou seja lá o que for – e graças ao voto – não são lideranças que emergem da prática política. São herdeiros dos cargos no patrimonialismo que nos caracteriza. Não foram forjados na luta. Foram descendentes somente. A estes se aplica um dito absolutamente falso: “quem é bom já nasce pronto”. O herdeiro nasce herdeiro. Nasce feito pelo sobrenome. Não lutará nem se fará. Ele é, não será. Um líder e um pensador se fazem na prática. Um herdeiro nasce herdeiro, ponto. E pronto.
A pergunta que se poderia fazer é sobre as razões que levam o povo a eleger estes “sobrenomes” eternos de nossa política. Há inúmeras, e uma delas provém precisamente das formas de relações entre a elite e “seus” subalternos. Em nossa sociedade jamais houve cidadania efetiva. Há subalternidade e dependência. E subalterno não tem voto independente. Elege os nomes badalados. A expressão “sorry periferia!” é talvez a fórmula síntese mais apropriada para estas relações. A periferia roda em torno do centro. A periferia está no em torno, como as mariposas rodam em torno da lâmpada. Ela se queima, mas retorna. Até morrer. E morre sempre desejando que seu filho não mais seja da periferia… Por isso, estando nela, procura a proteção dos herdeiros para produzir um herdeiro que penetre no mundo cujas portas sempre estiveram fechadas para ele. Este o sonho que vendem os herdeiros “Neto”, “Filho” ou “Junior” de nossa política.
Um líder se forja na luta. Pode fazer um nome. Terá necessariamente sucessores, não herdeiros. Somente a elite tem herdeiros. Ana Júlia não é herdeira de seu pai. É uma esperança que nasce e como esperanças de futuro é tudo que o pensamento dos herdeiros e seus sequazes não desejam, então é preciso destruir no nascedouro a víbora que poderá envenenar sua eterna arrogância.
por João Wanderley Geraldi | out 30, 2016 | Blog
POESIA
A palavra impossível
Deram-me o silêncio para eu guardar dentro de mim.
A vida que não se troca por palavras.
Deram-mo para eu guardar dentro de mim
As vozes que só em mim são verdadeiras.
Deram-mo para eu guardar dentro de mim
A impossível palavra da verdade.
Deram-me o silêncio como uma palavra impossível,
Nua e clara como o fulgor duma lâmina invencível,
Para eu guardar dentro de mim,
Para eu ignorar dentro de mim a única palavra sem disfarce –
A palavra que nunca se profere.
(Adolfo Casais Monteiro. Portugal. Rosa do mundo. 2001 poemas para o futuro. Lisboa : Assírio & Alvim)
PARA NÃO ESQUECER
Notícias
Da Argentina.
Às cinco da tarde, purificação pelo fogo. No pátio do quartel do Regimento Catorze, em Córdoba, o comando do Terceiro Exército “procede a incinerar esta documentação perniciosa, em defesa de nosso mais tradicional acervo espiritual, sintetizado em Deus, Pátria e Lar”.
Jogam-se os livros nas fogueiras. De longe, se avistam as chamas altas.
(Eduardo Galeano. Dias e noites de amor e de guerra. p. 200)
por João Wanderley Geraldi | out 28, 2016 | Blog
O Excelentíssimo Senhor Presidente da República, Michel Temer, informa à nação que os três poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – estão em franca harmonia.
Todo o quiproquó causado pela determinação judicial de prisão de membros da polícia legislativa, decisão judicial criticada pelo presidente do Senado e pelo presidente da Câmara de Deputados acabou! O ministro Teori, do STF, suspendeu a ação da PF e, consequentemente, a determinação do juiz da 10ª. Vara Federal de Brasília.
Quem não pode ter paz é a nação! Desejava o Sr. Presidente que se encerrasse a crise, mesmo tendo sido chamado seu Ministro da Justiça de chefete de polícia. Temer é magnânimo e releva a ofensa ao Executivo. Renan Calheiros é magnânimo, e releva o despreparo do juiz da 10ª. Vara Federal cuja determinação suspende o ministro da corte suprema. Que terá relevado o terceiro poder, aquele que neste golpe está assumindo, inconstitucionalmente, o papel de Poder Moderador, papel que tínhamos esquecido desde que desapareceu o Imperador?
Algo o Judiciário relevou. Terá sido o aumento de 43% que não houve? Foi isso que este poder relevou? Fica a dúvida.
Mas há algo no episódio que somado a outros episódios está mostrando como age o Poder Judiciário em suas pressas. Conforme o caso, anda a passo de tartaruga; ou anda rápido e irrequieto como se fosse uma lebre ou coelho correndo; ou voa como gavião atrás da caça, sem sobrevoos panorâmicos. Ou senão, lembremos:
- O pedido de afastamento de Eduardo Cunha da presidência da Câmara foi protocolado no STF em dezembro de 2015. A decisão de afastar do cargo e da Câmara acontece somente em fins de abril ou começos de maio… depois de entregue a fatura da votação calamitosa da aceitação do processo de impeachment. Passos de tartaruga do ministro Teori Zavacki.
- O requerimento dos advogados de Lula solicitando julgamento por juiz que não tivesse já manifestado sua opinião e que pudesse ser imparcial demorou uns tempos para ser indeferido, pois afinal o santo juiz Sérgio Moro é imparcial e competente para julgar, segundo Teori Zavacki (não segundo a ONU). Correndo como lebre…
- Suspensão da ação em tramitação na 10ª. Vara Federal de Brasília, soltando presos e anulando tudo se dá em menos de uma semana, assim que o Sr. Presidente da República pretendeu mostrar harmonia entre os poderes. Teori Zavacki apressou-se como um gavião ou águia atrás da presa.
Por isso, há outras duas dúvidas: ainda se decide conforme a lei? Decide-se com a pressa determinada pelas injunções da política e dos interesses que desconhecemos, a bem da nação, com toda convicção e boa fé?
Desculpem, esqueci que a Lava Jato e seus juízes – da primeira à última instância – trabalham em condições de excepcionalidade. Por isso definem sentidos e prazos segundo estas condições excepcionais. Logo, tudo está adequado e minhas dúvidas sumiram à medida que escrevia este texto que a mim próprio me esclareceu: tudo se tornou possível e os horizontes do futuro são largos e profundos.
por João Wanderley Geraldi | out 27, 2016 | Blog
Fiquei poucos dias sem conexão, visitando a família no interior da serra gaúcha. Foram poucos dias, mas em termos políticos parece ter decorrido uma eternidade. Acordei do sonho e da paz para encontrar um mundo de sobressaltos que merecem ao menos um breve comentário:
- O fracasso de Temer no Japão. Ele não retornou correndo por causa de mais uma prisão espetaculosa determinada pelo santo juiz, que neste caso despachou determinando o não uso de algemas, a não filmagem – que ocorreu como já comentei aqui – com todos os cuidados para preservar a dignidade de Eduardo Cunha e lhe dar o tratamento merecido por qualquer cidadão brasileiro. Temer voltou porque levou puxão de orelhas do primeiro ministro japonês e do capital japonês que reclama dos prejuízos causados pela devassa moriana que, à moda medieval e usando dos métodos inquisitoriais, está destruindo as grandes empresas brasileiras para que não concorram no mercado internacional, principalmente do Oriente Médio, com as construtoras norte-americanas. Os japoneses estão, com isso, tendo enormes prejuízos. Moreira Franco não terá dinheirinho japonês em suas parcerias…
- Carmen Lúcia, a presidenta do STF, passou a chamar a população brasileira de “jurisdicionados”. Como a maioria da população é suspeita diante da PF, afinal nas últimas eleições gerais a população escolheu uma candidata do PT, então todos nós somos suspeitos de corrupção. Os “manifestantes” agridem até bebês com roupinhas vermelhas… O ódio se tornou o melhor sentimento da antigamente chamada “cordialidade brasileira”.
- E aí um juiz de primeira instância, de uma Vara Federal – é sempre uma ‘vara federal’ – determina a prisão de membros da polícia legislativa porque fizeram varreduras em gabinetes, escritórios e casas de um ex-presidente da república e ex-senador e de outros senadores ou até mesmo de um deputado federal. Desligaram escutas clandestinas e grampos. É de sua função fazer isso. Foram presos porque as escutas e grampos tinham sido instalados pela PF a pedido da lava jato. Como se sabe, um telefone grampeado tem uma escuta na operadora, e não no telefone. Como se sabe, escutas dentro de casa são no mínimo ilegítimas se não ilegais. A Lava Jato quer ouvir até os sons de um casal na cama, porque o casal em lugar do bem bom, pode estar tramando seu fim.
- E Renan Calheiros faz sua função: como presidente do Senado tem a obrigação de defender que sua polícia cumpra suas obrigações. Foi excessivo ao chamar o juiz da 10ª. Vara Federal de “juizeco”. E ao ministro da justiça chama de delegado de polícia, o que não deixa de ser uma definição ajuizada de Alexandre Moraes.
- Numa demonstração do mais autêntico corporativismo, sai Carmen Lúcia, a presidenta, dizendo que “onde juiz for destratado, eu também sou”… É a canonização em vida, pelo mais alto poder judiciário, de todos os juízes do país independentemente de suas ações. O judiciário julga mas não admite ser julgado, não admite até mesmo que um cidadão tenha uma opinião desfavorável a uma atitude ou decisão de um juiz, porque Renan Calheiros é antes de tudo um cidadão.
- Rodrigo Maia, presidente da Câmara, sai em defesa de Renan dizendo que a decisão do juiz foi equivocada. Está armada a confusão entre os poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário em contenda.
- O pensamento de direita espalha correndo, através das mídias, que tudo isso de Renan Calheiros é porque ele está envolvido nas investigações da Lava Jato. E as charges o mostram como um rato. Não defendo nenhum corrupto, nem mesmo aqueles do partido em que sempre votei desde a década de 1980. Muito menos Renan Calheiros. Não vai daí que as condições da investigação tenham direitos a excepcionalidades e possa agir fora da lei, sem qualquer respeito a suspeitos. Quer dizer, há suspeitos delatados que por princípio são inocentes; há suspeitos delatados que mesmo não havendo provas, são criminosos antes mesmo do encerramento das investigações. É uma questão de convicção.
- Gilmar Mentes sai dizendo em entrevista que o nosso santo juiz não pode ser canonizado! E como todos sabem, o ministro do STF nas horas vagas de sua militância no PSDB, não prega prego sem estopa. Parece que, antes tarde do que nunca, vai o santo juiz investigar algum tucano de longo bico para parecer imparcial, uma qualidade que lhe falta a sobejo.
- Felizmente para todos nós, jurisdicionados e suspeitos simplesmente porque brasileiros votantes em quem eles acham que não se deveria votar, uma única instituição está de pé, forte e inabalável: a Lava Jato que paira acima dos chamados três poderes, que faz sua lei de boa fé, que investiga em condições de excepcionalidades, e por isso à margem da lei, como reconheceu, ao aceitar a excepcionalidade, o Tribunal de Recursos da Região Sul, sediado em Porto Alegre. Delegados, procuradores e juiz de nossa mais sólida instituição pública podem agir com excepcionalidade. Afinal, eles defendem que prova ilegal obtida de boa fé sempre será válida. E as formas da obtenção das provas hão de ser em condições de excepcionalidade. Estas condições incluem a tortura da prisão preventiva por tempo indeterminado.
- E enquanto tudo isso corre, o STF anula as gravações que pilharam o impoluto Demóstenes Torres, aquele senador que a Rede Globo tinha elevado aos altares da moralidade, e anula, em consequência, todas as provas obtidas contra o ex-senador. Isso mereceu uma pequena notinha na imprensa, quando a notinha houve. Tudo porque nesta investigação específica não houve boa fé nem convicção. Afinal, Demóstenes Torres é amigo de Gilmar Mentes, e membro do partido da ordem e do progresso norte-americano e das multinacionais, o PSDB. Mas esta instituição não é sólida nem inabalável, parece querer demonstrar o santo juiz de Curitiba. Gilmar Mentes não tem razão ao dizer que ele não deve ser canonizado. Ah! Bons eram os tempos do papa João Paulo II: o santo juiz ganharia altar rapidamente, e em vida, senão por milagres, pela comunhão ideológica.
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